terça-feira, 24 de maio de 2016

Garantia de direitos trabalhistas em momento de crise econômica





Garantia de direitos trabalhistas em momento de crise econômica
 
Por Raimundo Simão de Melo
 
 
O Direito do Trabalho nasceu por necessidade humanitária de se 
regulamentar as relações de trabalho entre empregadores e empregados, 
visando à proteção destes. O seu marco principal foi a Revolução 
Industrial, quando os trabalhadores eram expostos às mais indignas e 
desumanas condições de trabalho, cumprindo jornadas excessivas de até 16 
horas por dia, não tinham salário mínimo garantido e outros direitos 
básicos fundamentais ao asseguramento de uma mínima dignidade como seres 
humanos. Daí surgiu a organização sindical e a necessária intervenção do 
Estado, que até então era omisso.
 
A criação do Direito do Trabalho no Brasil teve início no começo do 
século XX, primeiro, totalmente legislado e, depois, normatizado pela 
Justiça do Trabalho através do seu poder normativo e mais na frente 
também de forma negociada, levando, com o tempo, a importantes 
conquistas, porém, com sacrifício e muita luta dos trabalhadores 
organizados em sindicatos, que nasceram livres e depois, especialmente 
na era Vargas a partir de 1937, passaram a ser controlados pelo Estado.
 
Com a Constituição Federal de 1988 os direitos sociais e fundamentais 
trabalhistas sofreram importante evolução, balizados pela valorização do 
trabalho humano, pelo valor social do trabalho e pela livre iniciativa 
(CF, artigos 1º e 170). Podemos afirmar, pois, que a Carta de 1988 
manteve direitos já existentes e acrescentou outros, voltados à 
personalidade do trabalhador, como a não discriminação e proteção á vida 
e integridade física e psíquica no ambiente de trabalho.
 
Com efeito, há muito tempo se faz presente no cenário jurídico 
trabalhista a discussão envolvendo a onda de mudanças dos direitos 
trabalhistas, uns preconizando a simples desregulamentação (deixar tudo 
para a livre negociação entre empregados e empregadores) e outros a sua 
flexibilização (flexibilizar a aplicação das normas trabalhistas).
 
É certo que o Direito do Trabalho no Brasil já está bastante 
flexibilizado, cujos importantes exemplos são a quebra da estabilidade 
no emprego, substituída pelo FGTS, a denúncia da Convenção 158 da OIT, 
que regula o procedimento de demissões coletivas e a criação da Lei 
6.019/74 sobre trabalho temporário, que com o tempo influenciou 
sobremaneira o processo de terceirização das atividades produtivas e de 
serviços, que avança a cada dia. Faz-se muito presente no momento o 
alerta de Cesarino Júnior sobre essa lei, o qual temia as suas 
consequências para o Direito do Trabalho já naquela época, dizendo que 
ela poderia eliminar toda uma legislação social trabalhista, se 
contivesse saídas e aberturas, porque nenhuma empresa iria contratar 
mais empregados para assumir o ônus da legislação trabalhista.
 
Nessa senda, o processo de globalização e as flutuantes e corriqueiras 
crises econômicas que têm atingido o mundo e o Brasil têm propiciado a 
diminuição de direitos trabalhistas (desregulamentação de alguns 
direitos e muita flexibilização de outros). Nesse contexto torna-se 
difícil manter as atuais conquistas e, mais ainda, conquistar novos 
direitos.
 
Em momento de crise econômica, como a que se vive hoje no Brasil, muitas 
vezes são as empresas que procuram os Sindicatos ou os trabalhadores 
diretamente, para negociar redução ou flexibilização de direitos, como, 
por exemplo, demissões em massa, planos de demissão voluntária, 
suspensão temporária do contrato de trabalho (lay-off) para participação 
dos empregados em cursos e programas de qualificação profissional, 
concessão de férias coletivas, redução temporária da jornada da trabalho 
e salário, pagamento parcelado das verbas rescisórias, entre outras 
situações não comuns em épocas normais.
 
Os sindicatos, que no Brasil, na sua maioria, são fracos e 
desorganizados, enfrentam muitas dificuldades para negociar com os 
patrões, especialmente em épocas de crise econômica. O certo é que em 
muitos casos não há verdadeiramente uma negociação, mas, imposição: o 
empregador apresenta uma única proposta sem oferecer alternativas e 
diálogo. É o “pegar ou largar”.
 
A negociação coletiva, certamente, é o meio mais importante para a 
solução dos conflitos de trabalho entre empregados e empregadores, desde 
que haja transparência e boa fé entre as partes. Assim, de um lado, 
devem as empresas, ao alegarem motivo de crise econômica, provar não 
apenas que estão lucrando menos, mas, que está sofrendo prejuízo a ponto 
de inviabilizar a sua atividade, porque como se sabe, há empresas em 
crise, mas outras se aproveitam do momento para querer reduzir custos e 
direitos. De outro lado, os Sindicatos devem agir com muito 
responsabilidade e criatividade e organizar os trabalhadores e a eles 
apresentar a situação real, a fim de obter aprovação de soluções que 
visem especialmente preservar empregos.
 
Ademais disso, não se pode prescindir da presença e participação do 
Estado em momentos de crise, de difícil solução direta entre as partes. 
O Estado tem obrigação de compreender a situação e contribuir na busca 
de soluções que evitem mais problemas sociais, porque baixa 
produtividade, desemprego e poucas vendas acarretam consequências para 
toda sociedade.
 
Nesse diapasão, invoco a participação do Executivo por meio do 
Ministério do Trabalho, ajudando nas negociações e, igualmente, do 
Ministério Público do Trabalho, que também tem papel importante na 
mediação de conflitos trabalhistas, desvestindo-se os seus membros, 
nessa tarefa, do seu poder investigativo. Igualmente, a Justiça do 
Trabalho, desde e especialmente a primeira instância, pode contribuir 
ajudando as partes na solução dos problemas, que se avolumam a cada dia, 
exercendo mais o seu papel conciliatório do que mesmo de julgar, que 
deve ficar para a última hipótese. Se o TST está abrindo a possibilidade 
de conciliação trabalhista antes do ajuizamento de Dissídios Coletivos, 
essa mesma solução deve ser pensada para a primeira instância, onde 
estão os graves e complexos problemas que afligem os trabalhadores, que 
muitas vezes perdem o emprego e sequer recebem os direitos básicos 
alimentares, e simplesmente terão que aguardar uma audiência de 
conciliação depois muitos meses pela frente.
 
É claro que estamos falando de um momento de crise, que se espera seja 
passageiro, mas que requer compreensão e esforço de todos para se 
encontrar soluções também passageiras, sem, pelo motivo da crise 
cíclica, retirar direitos básicos fundamentais dos trabalhadores, o 
chamado patamar civilizatório mínimo ao trabalhador, como preconiza 
Maurício Godinho Delgado (Curso de Direito do Trabalho. 15a ed. SP, LTr, 
2016, p. 1465-1467).
 
As questões são pontuais porque a atual crise econômica que assola o 
Brasil será passageira, como tantas outras que já enfrentamos, a qual 
não pode ser motivo para justificar um desmonte do Direito do Trabalho, 
como querem algumas pessoas não comprometidas com as garantias sociais 
mínimas dos trabalhadores.
 
 
Raimundo Simão de Melo é consultor jurídico e advogado. Procurador 
Regional do Trabalho aposentado. Doutor e Mestre em Direito das Relações 
Sociais pela PUC-SP. Professor titular do Centro Universitário UDF. 
Membro da Academia Nacional de Direito do Trabalho. Autor de livros 
jurídicos, entre outros Direito ambiental do trabalho e a saúde do 
trabalhador.
 
Revista Consultor Jurídico, 6 de maio de 2016, 11h43
 
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