quinta-feira, 25 de julho de 2013

Presidente Dilma veta fim da multa adicional de 10% sobre FGTS em demissão sem justa causa

Presidente Dilma veta fim da multa adicional de 10% sobre FGTS em demissão sem justa causa






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A presidente Dilma Rousseff vetou o projeto de lei que extinguiria a contribuição social adicional devida pelas empresas quando demitem trabalhadores sem justa causa. Em mensagem publicada no "Diário Oficial da União" desta quinta-feira, ela justifica que o projeto é contrário ao interesse público porque reduziria em R$ 3 bilhões por ano a receita do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).



Instituída por uma lei complementar em junho de 2001, a contribuição, na prática, elevou a multa paga pelas empresas nas demissões sem justa causa. Elas pagavam 40% e passaram a pagar 50% sobre o valor dos depósitos feitos na conta de FGTS do trabalhador demitido ao longo da duração do contrato de trabalho.



A pessoas demitidas continuaram a receber só os 40%. O adicional de 10% foi criado para ajudar a financiar os chamados créditos complementares do FGTS, cujo pagamento foi determinado pelo Supremo Tribunal Federal, após anos de briga judicial entre governo e entidades sindicais.



Com esse reforço, a Caixa Econômica Federal, agente operadora do FGTS, conseguiu ressarcir aos trabalhadores que tinham saldo de FGTS na época a correção monetária expurgada pelos planos econômicos Verão (16,64%, em janeiro de 1989) e Collor I (44,8%, em abril de 1990).



Pagos os créditos, no entanto, a contribuição criada para financiá-los permaneceu. O Congresso então aprovou, no ano passado, projeto fixando prazo para sua extinção. A redação final, encaminhada para sanção este ano, previa que a contribuição só seria cobrada até 1 de junho de 2013.



A sanção do projeto aprovado pelo Congresso "levaria à redução de investimentos em importantes programas sociais e em ações estratégicas de infraestrutura, notadamente naquelas realizadas por meio do Fundo de Investimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FI-FGTS. Particularmente, a medida impactaria fortemente o desenvolvimento do Programa Minha Casa, Minha Vida, cujos beneficiários são majoritariamente os próprios correntistas do FGTS", justificou a presidente Dilma em sua mensagem de veto .



Ela argumentou ainda que a proposta não foi acompanhada de estimativa de impacto orçamentário-financeiro e das devidas medidas para compensar esse impacto, como exige a Lei de Responsabilidade Fiscal nesses casos.



Valor Online



quarta-feira, 24 de julho de 2013

TRF4 garante licença-maternidade de 180 dias à mãe adotante

TRF4 garante licença-maternidade de 180 dias à mãe adotante






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O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) concedeu liminarmente, na última semana, licença-maternidade de 180 dias a uma servidora pública federal do Rio Grande do Sul que adotou uma criança. Conforme a decisão da 4ª Turma da corte, deve haver tratamento isonômico entre mães biológicas e mães adotantes, independentemente da idade da criança adotada.



Segundo o relator do processo, juiz federal Caio Roberto Souto de Moura, convocado para atuar na corte, “estão em jogo não só os interesses da servidora pública, mãe adotante, mas também os da criança adotanda, cuja possibilidade de convívio maior ou menor com a ‘nova’ mãe depende certamente da extensão da licença que a essa será concedida”.



Para o magistrado, não há fundamento que justifique o tratamento desigual entre a mãe biológica e a adotiva, assim como o tempo também não pode ser medido em função da idade do adotado. “É de ser considerado que a adaptação de uma criança de mais idade a uma nova família não há de ser mais fácil nem menos importante para o bom desenvolvimento das futuras relações familiares do que o seriam no caso de uma criança de colo”, ressaltou Moura.



A servidora ajuizou ação questionando o período estipulado pela legislação em vigor. Conforme a Lei 8.112/90, as servidoras públicas federais têm direito à licença-maternidade no caso de adoção por um período de 135 dias para crianças de até um ano de idade e de 45 dias para crianças maiores de um ano.



Seguro-desemprego será reajustado com base no mínimo a partir de agosto

Seguro-desemprego será reajustado com base no mínimo a partir de agosto






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O ministro do Trabalho, Manoel Dias, assegurou que o seguro-desemprego será reajustado a partir de agosto pelo mesmo percentual do salário mínimo, que foi de 9%. Desde janeiro, o benefício vem sendo corrigido pelo INPC, que foi de 6,2%, após decisão do ex-ministro da pasta, Brizola Neto, em cumprimento à orientação do governo na época, para quem ganha acima do piso. Segundo Dias, a Fazenda já deu aval à mudança e existe consenso no Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat), presidido pela pasta, para aprovar o novo reajuste. O Conselho se reúne no fim deste mês.



Porém, o ministério da Fazenda, por intermédio da assessoria de imprensa, negou que tenha decisão tomada no governo em relação ao aumento do seguro desemprego. Ainda de acordo com assessoria, a pasta considera que o momento atual é não conveniente para o aumento de despesas. Alegou também que não vê justificativa para mudar a forma de correção do benefício.





De acordo com dados do Ministério do Trabalho, a medida terá impacto de R$ 250 milhões até dezembro. Por mês são encaminhados à pasta 600 mil pedidos de seguro desemprego. Neste ano, a projeção de gasto com o benefício será de R$ 30 bilhões.



— O reajuste com base no INPC foi uma decisão do ex-ministro. Daqui para frente, valerá o mesmo reajuste do mínimo — afirmou Dias, ao divulgar os dados do emprego formal de junho.



O presidente do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), Sérgio Vidigal, informou que a decisão foi tomada numa reunião na Casa Civil, há três semanas, com a presença de vários ministérios. Evidente, admitiu ele, que existe a preocupação da Fazenda, em referência à necessidade de contenção de gastos para reverter a crise de credibilidade em relação à política econômica do governo.



O ministro adiantou também que o Tesouro Nacional vai aportar ainda neste ano R$ 7 bilhões para cobrir o descasamento entre receitas e despesas do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Ele destacou que as medidas de desoneração da alíquota do PIS tiveram impacto negativo na arrecadação do Fundo. Além disso, destacou o ministro, 40% das receitas doo FAT são repassadas para o BNDES. No ano passado, o governo também teve que injetar recursos no Fundo que tem registrado prejuízo.



Geralda Doca



quarta-feira, 17 de julho de 2013

Advogado. Assistência judiciária gratuita. Advogado particular.


|STJ - Rec. Esp. 1.153.163 - Rel.: Minª. Nancy Andrighi
 
Advogado. Assistência judiciária gratuita. Advogado particular. 
Contratação pela parte. Honorários advocatícios ad exito. Verba devida. 
Natureza jurídica de alimentos. Valor social do trabalho. Precedentes do 
STJ. Lei 1.060/1950, art. 3º, V. Lei 89.906/1994, arts. 22, § 2º e 23. 
CPC, art. 20. CF/88, arts. 1º, IV e 5º, LXXIV.
 
Nada impede a parte de obter os benefícios da assistência judiciária 
eser representada por advogado particular que indique, hipótese em que, 
havendo a celebração de contrato com previsão de pagamento de honorários 
ad exito, estes serão devidos, independentemente da sua situação 
econômica ser modificada pelo resultado final da ação, não se aplicando 
a isenção prevista no art. 3º, V, da Lei 1.060/1950, presumindo-se que a 
esta renunciou. 2. Recurso especial provido.»
 
... Cinge-se a lide a determinar se a assistência judiciária gratuita 
isenta o beneficiário do pagamento dos honorários advocatícios 
contratuais.
Inicialmente, ressalto que, apesar de não ter mencionado de forma 
expressa os arts. 22, § 2º, e 23 da Lei 8.906/94, constata-se o 
prequestionamento implícito desses dispositivos legais pelo TJ/RS, na 
medida em que o tema atinente à exigibilidade dos honorários 
advocatícios foi objetivamente apreciado pelo acórdão recorrido.
 
O benefício da assistência judiciária gratuita, previsto na Lei 
1.060/1950, tem como principal escopo assegurar a plena fruição da 
garantia constitucional de acesso à Justiça, prevista no art. 5º, XXXV, 
da CF/88, mediante a superação de um dos principais obstáculos ao 
ajuizamento de uma ação, consistente no custo financeiro do processo, 
que inclui despesas processuais e extraprocessuais, bem como os 
honorários advocatícios.
 
Diante disso, o art. 4º da Lei 1.060/1950 faculta a qualquer pessoa o 
gozo dos benefícios da assistência judiciária, mediante simples 
afirmação de que se encontra em situação econômica que lhe impede de 
arcar com as custas do processo e com os honorários de advogado, sem 
prejuízo
próprio ou de sua família.
 
Esta Corte, ciente do seu papel institucional de garantidor da 
cidadania, tem interpretado o referido benefício de forma abrangente, 
estendendoo, por exemplo, às pessoas jurídicas que demonstrem a 
impossibilidade de custear os encargos do processo (EREsp 321.997/MG, 
Corte
Especial, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJ de 16.08.2004) ou, ainda, 
reputando válido o seu deferimento emqualquer fase do processo, desde 
que demonstrado o preenchimento dos requisitos exigidos em lei (AgRg nos 
EDcl no Ag 728.657/SP, 3ª Turma, minha relatoria, DJ de 02.05.2006; e 
REsp 723.751/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 06.08.07).
Referência(s): • 321.997/STJ (Assistência judiciária. Justiça gratuita. 
Pessoa jurídica. Possibilidade. Irrelevância se possui fins beneficentes 
ou lucrativos. Precedentes do STJ. Lei 1.060/1950, art. 2º, parágrafo 
único).
. .
No que concerne especificamente à controvérsia dos autos, porém, o STJ 
ainda não consolidou o seu entendimento.
Há precedentes defendendo que a natureza do instituto, de mecanismo 
facilitador do acesso à justiça, aliada à própria literalidade do art. 
3º, V, da Lei 1.060/1950 – que não distingue os honorários sucumbenciais 
dos convencionais – impõe seja a isenção aplicada também aos honorários
advocatícios contratados. Confira-se, à guisa de exemplo, o precedente 
mencionado no próprio acórdão recorrido, REsp 309.754/MG, 4ª Turma, Rel. 
Min. Hélio Quaglia Barbosa, DJ de 11.02.2008.
Outros julgados, mantendo-se na linha de raciocínio da tese anterior, 
mas avançando nainterpretação sistemática da norma, sustentam que, à 
semelhança do que ocorre com os honorários sucumbenciais, os honorários 
convencionais somente serão exigíveis nas hipóteses em que o êxito na 
ação venha a modificar a condição financeira da parte, nos termos do 
art. 12 daLei 1.060/1950. Nesse sentido: RMS 6.988/RJ, 2ª Turma, Rel. 
Min. Ari Pargendler, DJ de 21.06.1999; e REsp 238.925/SP, 3ª Turma, Rel. 
Min. Ari Pargendler, DJ de 21.08.2001).
 
Filio-me, porém, a uma terceira corrente, entendendo que a escolha de 
um determinado advogado, mediante a promessa de futura remuneração em 
caso de êxito na ação, impede que os benefícios da Lei 1.060/1950 
alcancem esses honorários, dada a sua natureza contratual e 
personalíssima. Dessa forma, independentemente da situação econômica da 
parte ser modificada pelo resultado final da ação, havendo êxito, os 
honorários convencionais serão devidos.
 
Inclusive, foi esta a tese acolhida à unanimidade no julgamento do REsp 
965.350/RS, de minha relatoria, DJ de 03.02.2009, alçado a paradigma 
pelo recorrente.
 
Essa solução harmoniza o direito do advogado de receber o valor 
referente aos serviçosprestados com a faculdade de o beneficiário, 
mediante a celebração do denominado «contrato de risco». (em que o 
pagamento dos honorários se condiciona ao êxito no processo), escolher o 
profissional que considera ideal para a defesa de seus interesses.
 
Vale dizer, se a parte, a despeito de poder se beneficiar da 
assistência judiciária gratuita, opta pela escolha de um advogado 
particular em detrimento daqueles postos à sua disposição gratuitamente 
pelo Estado (a quem incumbe, nos termos do art. 5º, LXXIV, da CF/88, a 
assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem 
insuficiência de recursos), cabe a ela arcar com os ônus decorrentes 
desta escolha deliberada e voluntária.
 
Conforme destaquei em voto vista proferido no julgamento do aludido 
REsp 238.925/SP, uma vez realizado o contrato de prestação de serviços 
advocatícios «entende-se que a parte, embora 'necessitada', renunciou a 
um dos benefícios da assistência judiciária (a isenção do
pagamento da verba honorária). Não pode, portanto, deixar de cumprir a 
obrigação que livremente escolheu pactuar – pois poderia valer-se de 
serviços advocatícios gratuitos, por lei – alegando estado que já 
existia ao tempo dacelebração do pacto: situação econômica precária».
 
Com efeito, ainda que faça jus à assistência judiciária gratuita, a 
contratação de um advogado decorre da livre manifestação de vontade da 
parte, que certamente negociará o valor dos respectivos honorários em 
função da sua condição financeira (ou pelo menos da expectativa de ganho 
em caso de êxito na ação), não se podendo falar em supressão ou 
tolhimento da garantia constitucional de acesso à justiça.
 
Valiosa, nesse ponto, a lição de José Carlos Barbosa Moreira, de que «o 
fato de obtero benefício da gratuidade de maneira alguma impede o 
necessitado de fazer-se representar por profissional liberal. Se o seu 
direito abrange ambos os benefícios - isenção de pagamentos e a 
prestação de serviços -, nada obsta a que ele reclame do Estado apenas o 
primeiro. É antijurídico impor-lhe o dilema: tudo ou nada». (O direito à 
assistência jurídica: evolução no ordenamento brasileiro de nosso tempo. 
Revista de processo, São Paulo, Ano XVII, nº 67, jul/set 1992, p. 130) 
(sem grifos no original).
 
Ademais, como os honorários ad exito pressupõem o efetivo ganho da 
ação, a parte somente irá dispor de numerário depois que já tiver a 
contrapartida pela sua vitória, de sorte que sua situação financeira não 
será negativamente afetada, salvo se a verba honorária for fixada em 
valor abusivo, hipótese em que, por óbvio, poderá ser revista 
judicialmente.
 
Acrescente-se, ainda, que o recebimento dos honorários, cuja natureza 
alimentar já foi reconhecida não só pelo STJ (EREsp 706.331/PR, Rel. 
Min. Humberto Gomes de Barros, Corte Especial, DJ 31.03.2008), mas 
também pelo STF (RE 470.407/DF, 1ª Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 
13.10.2006; e RE 146.318/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 
04.04.1997), constitui direito do advogado, previsto expressamente no 
art. 22 da Lei 8.906/94 e que deve ser respeitado, sob pena de 
vilipendiar o valorsocial do trabalho, expresso no art. 1º, IV, da 
CF/88.
Referência(s): • 706.331/STJ (Honorários advocatícios. Advogado. 
Sucumbência. Alimentos. Natureza jurídica alimentar. CPC, art. 20. Lei 
11.033/2004, art. 19, I. Lei 8.906/94, arts. 22, 23 e 24).
. .
Finalmente, cumpre frisar que a hipótese dos autos não se equipara à do 
advogado dativo.
Como bem destaca Euro Bento Maciel, o paralelo não se coaduna com a 
sistemática daassistência judiciária, que é distinta da justiça 
gratuita.
Para o autor, na 'assistência judiciária' o Estado assume, pelo 
beneficiário, a obrigação de arcar com as despesas processuais e 
honorários advocatícios do patrono, que é nomeado pelo Juízo ou pela 
Ordem dos Advogados do Brasil, sem que lhe assista direito à livre 
escolha do profissional, enquanto que, na 'justiça gratuita' a isenção 
suportada pelo Estado serestringe às despesas processuais, sendo o 
patrono escolhido constituído e remunerado pelo próprio cliente». 
(Justiça gratuita e assistência judiciária. Honorários de advogado, in 
Revista do Advogado, nº 59, p. 63-69).
 
Embora essa divisão conceitual não conste da Constituição tampouco da 
Lei 1.060/1950, ela é útil para apontar a necessidade de se diferenciar 
a aplicação das isenções previstas no art. 3º da referida Lei, nas 
hipóteses em que o beneficiário seja representado por funcionário do 
serviço
organizado de assistência judiciária, ou por advogado dativo, e nos 
casos em que indique advogado, celebrando com ele contrato remunerado de 
prestação de serviços.
 
Em síntese, nada impede a parte de obter os benefícios da assistência 
judiciária e ser representada por advogado particular que indique, 
hipótese em que, havendo a celebração de contrato com previsão de 
pagamento de honorários ad exito, estes serão devidos, independentemente 
da sua situação econômica ser modificada pelo resultado final da ação, 
não se aplicando a isenção prevista no art. 3º, V, da Lei 1.060/1950, 
presumindo-se que a esta renunciou.
 
Logo, não constatada qualquer barreira ao recebimento dos honorários 
contratuais por parte do advogado que assistiu a parte beneficiária da 
assistência judiciária gratuita, merece reforma o acórdão recorrido.
 
Todavia, considerando tratar-se de ação de arbitramento de honorários, 
havendo inclusive laudo pericial produzido nos autos para esse fim, fica 
inviabilizada a aplicação do direito à espécie, por depender do 
revolvimento do acervo fático-probatório dos autos.
 
Assim, não resta alternativa senão a devolução dos autos ao TJ/RS para 
que prossiga na esteira do devido processo legal e arbitre os honorários 
advocatícios.
 
Forte nessas razões, DOU PROVIMENTO ao recurso especial, determinando 
abaixa dos autos à origem para arbitramento dos honorários advocatícios.
 
STJ - Rec. Esp. 1.153.163 - Rel.: Minª. Nancy Andrighi
 

INSS é condenado por litigância de má-fé


INSS é condenado por litigância de má-fé
O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) foi condenado por litigância de má-fé por ter alegado, em um processo trabalhista, que o valor sobre o qual incidem contribuições previdenciárias seria maior que o acordado entre uma trabalhadora e uma empresa.

Há litigância de má-fé quando o magistrado entende que uma das partes agiu de forma desleal no processo. Uma punição pode ser estipulada. No caso, o órgão deverá pagar multa de R$ 1 mil à trabalhadora.

A decisão é da 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) do Rio de Janeiro. Segundo advogados, condenações como essa são raras e podem fazer com que o INSS deixe de recorrer em processos nos quais existe acordo entre as partes ou sobre temas já pacificados na Justiça. "É muito difícil a União ser condenada por litigância de má-fé", diz o advogado AAAAAA.

Segundo o processo, o INSS questionou um acordo que previa o pagamento de R$ 45 mil à trabalhadora. Desse total, R$ 40 mil corresponderiam à indenização por danos morais, valor sobre o qual não incide contribuição previdenciária. Os outros R$ 5 mil seriam verbas salariais, que são tributadas.

Ao recorrer ao TRT, o INSS alegou que as contribuições previdenciárias deveriam ser calculadas sobre o valor total. Para o desembargador Luiz Alfredo Mafra Lino, relator do caso, o órgão agiu de má-fé porque está claro no termo firmado entre as partes que os R$ 40 mil não seriam tributados. Por meio de nota, a Advocacia-Geral da União (AGU) informou que vai "analisar a decisão e estudar qual posicionamento irá manifestar".

Bárbara Mengardo - De São Paulo

50 PERGUNTAS E RESPOSTAS SOBRE TRABALHO INFANTIL, PROTEÇÃO AO TRABALHO DECENTE DO ADOLESCENTE E APRENDIZAGEM

50 PERGUNTAS E RESPOSTAS SOBRE TRABALHO INFANTIL, PROTEÇÃO AO TRABALHO DECENTE DO ADOLESCENTE E APRENDIZAGEM


Ciente de que a conscientização é caminho a ser percorrido para extirpar do Brasil a chaga do trabalho infantil, a Comissão para Erradicação do Trabalho Infantil da Justiça do Trabalho (CETI) preparou 50 perguntas e respostas com o intuito de elucidar as dúvidas mais frequentes acerca do tema, bem como conferir maior visibilidade às normas jurídicas de proteção ao trabalho permitido do adolescente, com enfoque especial para o contrato de aprendizagem.

Esperamos, com esta e outras ações em curso, contribuir para a consecução do propósito do Brasil de, até 2015, erradicar as piores formas de trabalho infantil e, até 2020, todas as formas, bem com a construção de um País melhor. Eventuais críticas e/ou sugestões serão bem recebidas.

Junho de 2013

Comissão para Erradicação do Trabalho Infantil da Justiça do Trabalho

Tribunal Superior do Trabalho

Conselho Superior da Justiça do Trabalho



1) O que é trabalho infantil?



É considerado trabalho infantil, no Brasil, aquele realizado por crianças ou adolescentes com idade inferior a 16 (dezesseis) anos, a não ser na condição de aprendiz, quando a idade mínima permitida passa a ser de 14 (catorze) anos.

2) No trabalho doméstico, as idades são as mesmas?



Não. A idade mínima para o trabalho doméstico é 18 (dezoito) anos. Assim, todo trabalho doméstico realizado antes dessa idade será considerado infantil.

3) Por que para o trabalho doméstico a idade mínima é superior?



O Brasil ratificou a Convenção Nº 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que trata das piores formas de trabalho infantil, em que não se pode trabalhar antes dos 18 (dezoito) anos. Ao regulamentar a Convenção, pelo Decreto Nº 6.481/2008, o País incluiu entre as piores formas o trabalho doméstico.

4) Qual a razão para só poder realizar trabalho doméstico após os 18 anos?



O trabalho doméstico, segundo a Lista TIP (das piores formas de trabalho infantil), submete o trabalhador a riscos ocupacionais como esforços físicos intensos, isolamento, abuso físico, psicológico e sexual; longas jornadas de trabalho, trabalho noturno, calor, exposição ao fogo, posições antiergonômicas e movimentos repetitivos; tracionamento da coluna vertebral, e sobrecarga muscular. Tais riscos trazem, como possíveis consequências à saúde, afecções musculoesqueléticas (bursites, tendinites, dorsalgias, sinovites, tenossinovites), contusões, fraturas, ferimentos, queimaduras, ansiedade, alterações na vida familiar, transtornos do ciclo vigília-sono, DORT/LER, deformidades da coluna vertebral (lombalgias, lombociatalgias, escolioses, cifoses, lordoses), síndrome do esgotamento profissional e neurose profissional; traumatismos, tonturas e fobias. Tudo isso justifica a proibição.

5) Ser babá pode, não é?



Não, não pode! Babá também é empregada doméstica. Aliás, qualquer um que trabalhe para pessoa ou família, no (ou para o) âmbito residencial, é trabalhador doméstico. Assim, nem a atividade de babá nem outra qualquer nessa situação pode ser realizada por quem ainda não completou 18 (dezoito) anos.

6) Se não se pode trabalhar antes dessas idades, como é que existem crianças e adolescentes trabalhando em novelas, filmes e outras atividades artísticas?



Bem, há uma exceção à regra geral. O Brasil também ratificou a Convenção 138 da OIT sobre a idade mínima para admissão em emprego. A referida Convenção, no artigo 8º, diz que a autoridade competente pode, mediante licenças concedidas em casos individuais, permitir a participação em representações artísticas. Dispõe, porém, que licenças dessa natureza limitarão não apenas o número de horas de duração do emprego ou trabalho, mas estabelecerão as condições em que é permitido.



7) Mas a Constituição Federal abre tal exceção?



Não, mas tem se entendido que, por se tratar de norma que versa sobre direito fundamental do ser humano, a Convenção Nº 138 da OIT teria sido recepcionada pelo ordenamento jurídico brasileiro com status constitucional, ou seja, equivaleria a uma emenda constitucional.

8) Quem pode dar essa autorização?



Há ainda controvérsia a respeito, pois a tarefa sempre foi confiada ao Juiz da Infância e da Juventude. Entretanto, estudos recentes indicam que, depois do advento da Emenda Constitucional Nº 45/2004, que ampliou consideravelmente a competência da Justiça do Trabalho, só o Juiz do Trabalho pode apreciar a matéria, concedendo ou não autorização.

9) Por que o Juiz do Trabalho?



Ora, estando as consequências do trabalho afetas à Justiça do Trabalho, não há o que justifique que a autorização que o antecede seja dada por juiz que, depois, será incompetente para analisar tais efeitos. A questão é jurídica, de lógica, envolve a necessidade de unidade de convicção e interpretação sistemática. Veja que qualquer relação de trabalho, seja ela ou não de emprego, será apreciada por um Juiz do Trabalho. Assim, se a criança ou adolescente, no exercício de trabalho autorizado judicialmente, sofre acidente do trabalho, danos – material ou moral –, se o contratante sofre fiscalização e sanção do Ministério do Trabalho e Emprego, enfim, se há alguma consequência do trabalho, será o Juiz do Trabalho o competente para instruir e julgar eventual ação ajuizada, e não há explicação plausível para que as autorizações de trabalho que originaram tais efeitos tenham sido dadas por quem não poderá apreciá-los. Assim, não é razoável manter-se a competência do Juiz da Infância e da Juventude, conforme lhe atribuem textos infraconstitucionais que não foram recepcionados pela EC Nº 45/2004.

10) Então o Juiz do Trabalho sempre vai dar autorização quando for trabalho artístico infantil?



Não, tais autorizações devem ser excepcionalíssimas, individuais (não podem ser coletivas), com observância do princípio da proteção integral da criança ou do adolescente, e atentando para que seus interesses sejam atendidos com prioridade absoluta sobre quaisquer outros, inclusive os de emissoras de televisão, empresas cinematográficas, teatrais, enfim, de quaisquer daqueles que sejam tomadores dos serviços. E o juiz deverá, ainda, fixar as condições em que o trabalho será exercido.

11) E que condições são estas?



Bem, não há ainda lei prevendo quais seriam essas condições. Entretanto, mesmo assim, conforme autorização legal, o juiz já pode estabelecer, por exemplo, que a atividade tenha fim educativo ou não seja, de qualquer modo, prejudicial ao desenvolvimento físico, mental ou psicológico, ou à formação moral do artista infanto-juvenil; que haja autorização escrita dos exercentes do poder familiar ou responsáveis legais da criança ou adolescente para cada trabalho realizado; que não seja possível o

desenvolvimento da atividade artística objeto da contratação por pessoas com mais de dezesseis anos; que seja submetida a criança ou adolescente, quando a relação for empregatícia, a exames médico-psicológico admissional, periódicos e demissional; que comprovadamente não haja nenhum prejuízo à educação escolar básica; que o meio ambiente do trabalho seja equilibrado, saudável e adequado para o trabalho e frequência de crianças e adolescentes. Além disso, além da representação ou assistência dos exercentes do poder familiar ou representantes legais da criança ou adolescente, poderá o juiz fixar, como outros pressupostos de validade da contratação, que haja ajuste escrito e, se for o caso, registro e anotação na Carteira de Trabalho e Previdência Social; jornada de trabalho contratada, nunca excedente dos limites legais, nela compreendido o tempo destinado a ensaios e decoração de textos, com delimitação clara dos intervalos para repouso e alimentação; valor e forma de pagamento; obrigatoriedade de depósito de pelo menos 50% (cinquenta por cento) de tudo que for auferido pelo trabalhador em caderneta de poupança aberta em seu nome, em banco oficial, que só poderá ser movimentada quando adquirida a capacidade civil plena, ou antes, mediante autorização judicial, em casos em que os interesses da criança ou adolescente assim recomendem. Tudo isso deverá constar do alvará judicial, em cláusulas claras, de preferência com prazo de validade exíguo (recomendável no máximo seis meses), que estabelecerá também outras obrigações do contratante, como matrícula, frequência e bom aproveitamento escolar, que poderá ser aferido a qualquer tempo; fixação dos horários de trabalho, nunca incompatíveis com os escolares ou que, de qualquer modo, impeçam a criança ou adolescente de participar de atividades educacionais ou restrinjam excessivamente o tempo de lazer; acompanhamento da criança ou adolescente por exercente do poder familiar, responsável legal ou quem o represente durante a prestação de serviços; garantia de assistência médica, odontológica e psicológica, sempre que necessária ou permanentemente, quando o caso específico recomendar. Poderá ainda exigir o juiz, antes de autorizar, a análise do caso por assistente social e/ou psicólogo.

12) Bem, então não é tão simples assim?



Não é, nem deve ser, pois o trabalho artístico pode, se não adotados os cuidados necessários, trazer sérios prejuízos à formação das crianças e adolescentes envolvidos.

13) É verdade que o juiz pode autorizar o trabalho de adolescentes antes da idade mínima, como em ruas e praças, quando isso for necessário para sua subsistência ou de seus pais, avós ou irmãos?



Não, isso não é mais possível. Há, de fato, previsão a respeito no artigo 405 da CLT, mas ela colide com a da Constituição Federal. Ou seja: não foi recepcionada pelo texto constitucional e, por isso, é inaplicável. Aliás, esse tipo de atividade está proibido também na lista TIP (das piores formas de trabalho infantil, item 73), pois expõe à violência, drogas, assédio sexual e tráfico de pessoas; à radiação solar, chuva e frio; acidentes de trânsito e atropelamento. Pode causar sérios danos à saúde do adolescente, em razão de ferimentos e comprometimento do desenvolvimento afetivo; dependência química, doenças sexualmente transmissíveis, atividade sexual precoce, gravidez indesejada, queimaduras na pele, envelhecimento precoce, câncer de pele, desidratação, doenças respiratórias, hipertermia, traumatismos, entre outros problemas. A rua é campo fértil para prejuízos diversos.



14) Mas o intuito, como diz a lei, não é propiciar sustento próprio e o dos familiares de pessoas pobres?



Segundo a lei sim, mas isso é uma subversão da ordem natural das coisas. Crianças e adolescentes devem ser protegidos, e não proteger. A família, a sociedade e o Estado devem conferir-lhes proteção integral e prioritária, conforme o artigo 227 da Constituição Federal e de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente.

Assim, não é possível conceber que uma criança ou adolescente trabalhe para obter o próprio sustento ou de seus familiares. Deve acontecer justamente o contrário: a família deve ser a responsável por prover alimentos e bens necessários a essas pessoas em peculiar condição de desenvolvimento. Se a família falhar, entram a sociedade e o Estado. A ordem de proteção não precisa ser essa. O que não pode é todos falharem.

15) E não há casos em que todos falham?



Sem dúvida há. O conformismo, entretanto, não é uma opção. Temos que lutar para fazer prevalecer o comando constitucional. Há a necessidade de políticas públicas eficazes de inclusão, formação e qualificação profissional, no tempo certo e de modo correto.

16) Não é melhor uma criança ou adolescente pobre trabalhar do que roubar?



Esse é só um dos mitos que precisam ser combatidos. Essa não pode ser a opção. Crianças e adolescentes têm o direito ao não trabalho. Às crianças deve ser assegurada uma infância feliz, lúdica, a participação em brincadeiras próprias da idade. A elas, a partir da idade correta, e aos adolescentes, educação pública de qualidade, de preferência integral. Aos adolescentes e jovens, qualificação profissional. Ou seja: o Estado tem o dever de garantir que o roubo ou qualquer outra atividade criminosa não seja opção única de quem não trabalha. Se ocuparmos adequadamente nossas crianças, adolescentes e jovens, estaremos construindo um futuro melhor para eles, mas também para todos nós. O trabalho precoce alimenta um ciclo vicioso de miséria e destrói sonhos.

17) Até que idade a pessoa é considerada criança:



De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), até os 12 (doze) anos incompletos.

18) E adolescente?



Também segundo o ECA, dos 12 (doze) completos aos 18 (dezoito) anos incompletos de idade.

19) O certo não seria considerar trabalho infantil apenas o exercido por crianças?



O Brasil optou por considerar trabalho infantil aquele realizado antes das idades mínimas permitidas, conforme já dito. Para alguns efeitos, é considerado infantil o trabalho desenvolvido antes dos 18 (dezoito) anos, como é o caso daqueles descritos na lista TIP.



20) Como ter acesso a essa Lista TIP para saber o que é proibido?



Bem, a Lista TIP é um anexo do Decreto nº 6481/2008, que regulamenta, no Brasil, a Convenção Nº 182 da OIT, sobre as piores formas de trabalho infantil. Ela tem 93 itens de proibição. Desdobra-se em: I) Trabalhos prejudiciais à saúde e à segurança; II) Trabalhos Prejudiciais à Moralidade. No primeiro tópico, contempla atividades desenvolvidos em setores da agricultura, pecuária, silvicultura e exploração florestal; pesca; indústria extrativa; indústria da transformação; produção e distribuição de eletricidade, gás e água; construção; comércio (reparação de veículos automotores objetos pessoais e domésticos); transporte e armazenagem; saúde e serviços sociais; serviços coletivos, sociais, pessoais e outros; serviço doméstico e outras que envolvem riscos em quaisquer situações. No segundo bloco, são mais 4 itens descrevendo atividades prejudiciais à moralidade.

21) O trabalho noturno é proibido? Em que idade e de que horas a que horas?



Sim, o trabalho noturno é proibido para quem ainda não completou 18 (dezoito) anos. O legislador deveria ter estabelecido um horário mais dilatado para a proibição, como das 19h de um dia às 7h do outro. Mas não o fez. Assim, só é considerado noturno o trabalho compreendido entre 22h de um dia e 5h do outro na zona urbana. Para o trabalho na zona rural, tem se entendido que se aplica a lei do rural. A proibição, assim, envolve trabalho das 21h às 5h se for na lavoura e das 20h às 4h se for na pecuária.

22) Há outros tipos de trabalho proibidos para quem ainda não completou 18 anos?



Sim. Aquele que ainda não tem 18 (dezoito) anos não pode realizar trabalho insalubre, perigoso ou penoso. Também é vedado o trabalho que seja prejudicial à formação do adolescente, ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social e em horários e locais que não permitam a frequência à escola. A Lista TIP traz relacionada as proibições.

23) Adolescente pode cumprir horas extraordinárias?



Em regra, não. Aliás, se ele tiver mais de um emprego, as horas têm que ser somadas, não podendo ultrapassar os limites legais. Entretanto, é possível a prorrogação da jornada, somente se autorizada por norma coletiva (Convenção ou Acordo Coletivo de Trabalho), até o limite de duas horas diárias e desde que para compensação dentro da própria semana (exemplo: não trabalhar aos sábados e dividir as horas entre os outros dias da semana). De qualquer modo, o limite semanal de 44 horas (ou outro inferior estabelecido) não poderá ser ultrapassado. Neste caso, se respeitados todos esses parâmetros, não haverá acréscimo salarial (adicional de 50%). Note-se que para o adolescente não é possível acordo individual.



24) Fora a hipótese de compensação, é possível dilatar a jornada do adolescente?



Pela legislação vigente, ainda é. Excepcionalmente, em caso de força maior, o adolescente, desde que sua permanência seja imprescindível ao funcionamento do estabelecimento, poderá permanecer mais quatro horas além da jornada normal. Nesse caso, receberá tais horas extraordinárias com adicional de pelo menos 50%.

25) Nas hipóteses acima, é necessário algum intervalo antes da prorrogação?



Sim. A CLT equiparou, para tal fim, o trabalho do adolescente ao da mulher, obrigando a um intervalo de 15 (quinze) minutos entre o término da jornada normal e o início da prorrogação.

26) O que é trabalho em regime familiar?



Ocorre trabalho em regime familiar quando alguém presta serviços em oficinas nas quais trabalhem exclusivamente pessoas de sua família, hipótese em que é excluído (parágrafo único do artigo 402 da CLT) do âmbito de aplicação do Capítulo que trata da proteção conferida ao trabalhador adolescente (IV).

27) O trabalho em regime familiar configura vínculo empregatício?



Não, pois decorre do exercício do poder familiar (antigo pátrio-mátrio poder), que confere aos pais o direito de, entre outras coisas, dirigir a criação e educação dos filhos, exigindo que estes lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição (art. 1634, I e VII do novo Código Civil). De qualquer forma, essa é exceção que, para ser válida, tem as mesmas restrições de jornada que existem para todos os adolescentes, proíbe trabalho noturno, insalubre, perigoso e penoso e veda, igualmente, o trabalho em locais prejudiciais à moralidade.

28) O que é contrato de aprendizagem?



É um contrato especial, que deve ser escrito e tem prazo determinado de no máximo dois anos, com a finalidade principal de assegurar ao aprendiz formação técnico-profissional metódica. Ou seja: deve haver método que alie trabalho e educação, com aumento progressivo da complexidade das atividades, para qualificação profissional do aprendiz.

29) Qual a idade em que é permitida a aprendizagem?



Como exceção à regra de que o trabalho só é permitido a partir dos 16 anos, a aprendizagem pode começar aos 14. A idade máxima é de 24 anos, mas, se o aprendiz for pessoa com alguma deficiência, esse limite poderá ser ultrapassado, assim como a duração de dois anos.



30) O contrato de aprendizagem é de emprego?



Sim, o aprendiz é empregado. Não é um contrato comum, pois tem contornos especiais. Distingue-se dos demais especialmente pela natureza formativa-educacional voltada para a qualificação profissional, mas tem como pressuposto de validade, inclusive, a anotação na CTPS.

31) O aprendiz precisa ir à escola?



Se o aprendiz, independentemente da idade, não tiver concluído o ensino médio, precisa matricular-se e frequentar a escola para que essa modalidade especial de contratação seja válida. Há exceção apenas em locais em que não seja oferecido ensino médio, quando estará dispensado da escola, desde que haja concluído o ensino fundamental.

32) A qualificação do aprendiz se dá somente pelo trabalho?



Não. Há a necessidade de inscrição do aprendiz em programa de aprendizagem (com conteúdo pedagógico) desenvolvido sob orientação de entidade qualificada em formação técnico-profissional metódica, aliando teoria e prática.

33) Em se tratando de aprendizagem por adolescente, há alguma outra exigência?



Sim, em razão da proteção integral e prioritária que lhe deve ser destinada, a formação em questão deve revelar-se compatível com o desenvolvimento físico, moral e psicológico do aprendiz.

34) O aprendiz tem direito a salário igual ao dos demais trabalhadores?



Não. Está assegurado o salário-mínimo-hora ao aprendiz, seja ele adolescente ou jovem. Não haverá direito a receber mais, exceto se houver previsão específica de condição mais benéfica para o aprendiz, e não genérica, como aquela que estipula o piso salarial para a categoria em Convenção ou Acordo Coletivo de Trabalho, que só se aplicam ao aprendiz se dispuserem, elas próprias, nesse sentido. O salário será proporcional às horas trabalhadas.

35) As empresas têm a obrigação de contratar aprendizes?



Sim, são obrigadas por lei a contratar, como aprendizes, 5% dos trabalhadores existentes em cada estabelecimento cujas funções demandem formação profissional, nunca excedendo a 15%. Havendo frações de unidade quando calculadas as percentagens, elas darão lugar à admissão de um aprendiz.

36) Todas as empresas têm essa obrigação?



Estão dispensadas da contratação de aprendizes as microempresas e as empresas de pequeno porte (Lei 9.841/99, art. 11; art. 14, I, do Decreto 5.598/2005). O art. 429 da CLT excepciona, ainda, da limitação nele fixada, as entidades sem fins lucrativos que tenham por objetivo a educação profissional (§ 1º).



37) Entre adolescentes e jovens com mais de 18 anos, deve haver alguma prioridade na contratação?



Os adolescentes deverão ter prioridade na contratação, exceto em hipóteses em que se sujeitem a insalubridade ou periculosidade (sem que o risco possa ser eliminado ou haja ambiente simulado), a lei exija licença ou autorização vedada para quem ainda não completou 18 anos, ou haja incompatibilidade com o seu desenvolvimento físico, psicológico ou moral. Em tais hipóteses, só jovens com mais de 18 anos de idade poderão ser contratados como aprendizes.

38) Quem deve ministrar a aprendizagem?



Em regra, a aprendizagem deve ser ministrada pelas entidades integrantes do Sistema Nacional de Aprendizagem, o conhecido sistema “S”. São elas: Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC), Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR), Serviço Nacional de Aprendizagem de Transportes (SENAT) e Serviço Nacional de Aprendizagem de Cooperativismo (SESCOOP).

39) Se faltarem cursos ou vagas no sistema “S”?



Aí a aprendizagem poderá ser ministrada por Escolas Técnicas de Educação (inclusive agrotécnicas) ou, no caso dos adolescentes, por entidades sem fins lucrativos, que tenham por objetivo a assistência ao adolescente e à educação profissional, desde que registradas no Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente.

40) É possível a contratação direta pelas entidades?



Sim, as entidades sem fins lucrativos podem ser as empregadoras dos aprendizes, anotando, inclusive, o contrato na CTPS. Nesse caso, não haverá vínculo de emprego com o tomador de serviços, que, no entanto, poderá utilizar os aprendizes a seu serviço para o preenchimento das cotas. O tomador terá responsabilidade subsidiária em caso de eventual frustração dos direitos dos aprendizes.

41) Há alguma jornada especial para o aprendiz?



Sim. Os aprendizes que não completaram o ensino fundamental têm jornada diária de trabalho limitada a seis horas, sendo proibidas a prorrogação e compensação de horários (art. 432 da CLT). Se já completado o ensino fundamental, o limite diário é de oito horas. Na jornada deverá estar compreendido o tempo destinado à teoria.

42) As aulas teóricas podem ser ministradas na empresa?



As aulas teóricas devem ser ministradas “em ambiente físico adequado ao ensino, e com meios didáticos apropriados”. A teoria, conforme permite o decreto que regulamenta a aprendizagem (Decreto Nº 5.598/2005 art. 22, § 1º), pode ser dada “sob a forma de aulas demonstrativas no ambiente de trabalho”, sendo vedada, porém, na hipótese, qualquer atividade laboral durante as aulas. Além disso, é vedado ao tomador dos serviços do aprendiz cometer-lhe atividades diversas daquelas previstas no programa de aprendizagem em desenvolvimento.



43) E as aulas práticas?



As aulas práticas podem ocorrer na própria entidade qualificada em formação técnico-profissional metódica, mas é mais comum que sejam ministradas na empresa, hipótese em que ela deve designar (art. 23, § 1º, do Decreto Nº 5.598/2005), formalmente, empregado monitor, responsável pela coordenação de exercícios práticos e acompanhamento das atividades do aprendiz, de acordo com o programa de aprendizagem.

44) O aprendiz tem direito a certificado de qualificação?



Sim, ao concluir com aproveitamento a aprendizagem, é-lhe assegurado certificado de qualificação profissional, que trará enunciado “o título e o perfil profissional para a ocupação na qual o aprendiz foi qualificado” (art. 31, parágrafo único, do Decreto 5.598/2005).

45) O FGTS do aprendiz é igual ao dos demais trabalhadores?



Não, a lei prevê que o FGTS do aprendiz é de 2%. Isso se justifica em razão da natureza especial do contrato.

46) O aprendiz tem direito de fazer coincidir suas férias com as escolares?



Se for adolescente, como qualquer trabalhador que ainda não completou 18 anos, terá direito de coincidir as férias no trabalho com um dos períodos das férias escolares, conforme o art. 136, § 2º, da CLT. Além disto, não poderá haver fracionamento (art. 134, § 2º, da CLT).

47) O aprendiz tem direito ao vale-transporte?



Sim, e o benefício deve compreender os trajetos necessários ao deslocamento, não apenas entre a residência e a empresa (e vice-versa), como também o da instituição onde cursa o programa de aprendizagem, já que o contrato de aprendizagem engloba, também, as horas que passa na instituição.

48) O aprendiz pode ser despedido antes de expirado o prazo?



Tem se entendido que em razão do caráter educacional da aprendizagem, o aprendiz tem garantia de emprego. Em razão disso, a lei prevê as hipóteses de rompimento do contrato: a) no termo incialmente ajustado: b) quando o aprendiz completar 24 anos (exceto se pessoa com deficiência); c) por desempenho insuficiente ou inadaptação; d) falta disciplinar grave (justa causa); e) ausência injustificada à escola que implique perda do ano letivo (se não houver completado o ensino médio); e f) a pedido do aprendiz. A doutrina identifica outras hipóteses de rompimento antecipado: despedida indireta, culpa recíproca, extinção do estabelecimento, morte do empregador pessoa física ou empresário e até falência, quando não autorizada a continuidade do negócio. Se despedido fora das hipóteses mencionadas, poderá pleitear, inclusive, reintegração.



49) Se não preenchidos todos os requisitos necessários para a aprendizagem, o que ocorrerá?



Bem, aí estaremos diante de uma falsa aprendizagem. Nesse caso, haverá uma relação de emprego comum e o suposto aprendiz (adolescente ou jovem) poderá ingressar com ação pleiteando, por exemplo, diferenças salariais (baseando-se em pisos salariais previstos em normas coletivas para a categoria, etc.) e reflexos (sobre 13ºs salários, férias, FGTS, etc.), diferenças de FGTS (em razão da alíquota), descaracterização do contrato por prazo determinado (com indenização de aviso-prévio e todas as demais verbas rescisórias decorrentes), entre outros direitos assegurados aos trabalhadores em geral.

50) O empregador do aprendiz tem alguma vantagem?



Sem dúvida. Em primeiro lugar, proporcionando aprendizagem verdadeira, o empregador contribuirá com a qualificação de adolescentes e jovens, agindo com responsabilidade e no cumprimento da função social da empresa. Além disso – que não é pouco! – poderá, mantendo os melhores aprendizes como empregados depois do término do programa, qualificar melhor seu quadro de pessoal. Não fosse o bastante, em razão das peculiaridades e de sua especial natureza educacional, que se sobrepõe ao aspecto produtivo, o contrato de aprendizagem tem menor custo que o comum. Embora o propósito não seja barateamento puro e simples, a alíquota do FGTS é menor (2%), há exigência apenas de observância inicial do salário-mínimo horário, é possível a contratação por intermédio de entidade qualificada (que normalmente paga encargos menores), enfim, há estímulos para fomentar a contratação de aprendizes. Será, enfim, partícipe da transformação, para melhor, da realidade socioeconômica dos envolvidos e, em última análise, do nosso País.

Origem TST -

CONCURSO PÚBLICO. PREVISÃO DE VAGAS EM EDITAL. DIREITO À NOMEAÇÃO DOS CANDIDATOS APROVADOS.

10/08/2011 PLENÁRIO


RECURSO EXTRAORDINÁRIO 598.099 MATO GROSSO DO SUL

RELATOR :MIN. GILMAR MENDES

RECTE.(S) :ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL

PROC.(A/S)(ES) :PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DO MATO GROSSO DO

SUL

RECDO.(A/S) :RÔMULO AUGUSTO DUARTE

ADV.(A/S) :ANA KARINA DE OLIVEIRA E SILVA E OUTRO(A/S)

INTDO.(A/S) :UNIÃO

ADV.(A/S) :ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO

INTDO.(A/S) :MUNICIPIO DO RIO DE JANEIRO

PROC.(A/S)(ES) :PROCURADOR-GERAL DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL.

CONCURSO PÚBLICO. PREVISÃO DE VAGAS EM EDITAL. DIREITO

À NOMEAÇÃO DOS CANDIDATOS APROVADOS.

I. DIREITO À NOMEAÇÃO. CANDIDATO APROVADO DENTRO

DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. Dentro do prazo de

validade do concurso, a Administração poderá escolher o momento no

qual se realizará a nomeação, mas não poderá dispor sobre a própria

nomeação, a qual, de acordo com o edital, passa a constituir um direito do

concursando aprovado e, dessa forma, um dever imposto ao poder

público. Uma vez publicado o edital do concurso com número específico

de vagas, o ato da Administração que declara os candidatos aprovados no

certame cria um dever de nomeação para a própria Administração e,

portanto, um direito à nomeação titularizado pelo candidato aprovado

dentro desse número de vagas.

II. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA

JURÍDICA. BOA-FÉ. PROTEÇÃO À CONFIANÇA. O dever de boa-fé da

Administração Pública exige o respeito incondicional às regras do edital,

inclusive quanto à previsão das vagas do concurso público. Isso

igualmente decorre de um necessário e incondicional respeito à segurança

jurídica como princípio do Estado de Direito. Tem-se, aqui, o princípio da

segurança jurídica como princípio de proteção à confiança. Quando a

Liberado para assinatura

RE 598.099 / MS

Administração torna público um edital de concurso, convocando todos os

cidadãos a participarem de seleção para o preenchimento de

determinadas vagas no serviço público, ela impreterivelmente gera uma

expectativa quanto ao seu comportamento segundo as regras previstas

nesse edital. Aqueles cidadãos que decidem se inscrever e participar do

certame público depositam sua confiança no Estado administrador, que

deve atuar de forma responsável quanto às normas do edital e observar o

princípio da segurança jurídica como guia de comportamento. Isso quer

dizer, em outros termos, que o comportamento da Administração Pública

no decorrer do concurso público deve se pautar pela boa-fé, tanto no

sentido objetivo quanto no aspecto subjetivo de respeito à confiança nela

depositada por todos os cidadãos.

III. SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS. NECESSIDADE DE

MOTIVAÇÃO. CONTROLE PELO PODER JUDICIÁRIO. Quando se

afirma que a Administração Pública tem a obrigação de nomear os

aprovados dentro do número de vagas previsto no edital, deve-se levar

em consideração a possibilidade de situações excepcionalíssimas que

justifiquem soluções diferenciadas, devidamente motivadas de acordo com

o interesse público. Não se pode ignorar que determinadas situações

excepcionais podem exigir a recusa da Administração Pública de nomear

novos servidores. Para justificar o excepcionalíssimo não cumprimento do

dever de nomeação por parte da Administração Pública, é necessário que

a situação justificadora seja dotada das seguintes características: a)

Superveniência: os eventuais fatos ensejadores de uma situação

excepcional devem ser necessariamente posteriores à publicação do edital

do certame público; b) Imprevisibilidade: a situação deve ser determinada

por circunstâncias extraordinárias, imprevisíveis à época da publicação

do edital; c) Gravidade: os acontecimentos extraordinários e imprevisíveis

devem ser extremamente graves, implicando onerosidade excessiva,

dificuldade ou mesmo impossibilidade de cumprimento efetivo das

regras do edital; d) Necessidade: a solução drástica e excepcional de não

cumprimento do dever de nomeação deve ser extremamente necessária,

de forma que a Administração somente pode adotar tal medida quando

2

Liberado para assinatura

RE 598.099 / MS

absolutamente não existirem outros meios menos gravosos para lidar

com a situação excepcional e imprevisível. De toda forma, a recusa de

nomear candidato aprovado dentro do número de vagas deve ser

devidamente motivada e, dessa forma, passível de controle pelo Poder

Judiciário.

IV. FORÇA NORMATIVA DO PRINCÍPIO DO CONCURSO

PÚBLICO. Esse entendimento, na medida em que atesta a existência de

um direito subjetivo à nomeação, reconhece e preserva da melhor forma a

força normativa do princípio do concurso público, que vincula diretamente a

Administração. É preciso reconhecer que a efetividade da exigência

constitucional do concurso público, como uma incomensurável conquista

da cidadania no Brasil, permanece condicionada à observância, pelo

Poder Público, de normas de organização e procedimento e,

principalmente, de garantias fundamentais que possibilitem o seu pleno

exercício pelos cidadãos. O reconhecimento de um direito subjetivo à

nomeação deve passar a impor limites à atuação da Administração

Pública e dela exigir o estrito cumprimento das normas que regem os

certames, com especial observância dos deveres de boa-fé e incondicional

respeito à confiança dos cidadãos. O princípio constitucional do concurso

público é fortalecido quando o Poder Público assegura e observa as

garantias fundamentais que viabilizam a efetividade desse princípio. Ao

lado das garantias de publicidade, isonomia, transparência,

impessoalidade, entre outras, o direito à nomeação representa também

uma garantia fundamental da plena efetividade do princípio do concurso

público.

V. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO.

3

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10/08/2011 PLENÁRIO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 598.099 MATO GROSSO DO SUL

RELATOR :MIN. GILMAR MENDES

RECTE.(S) :ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL

PROC.(A/S)(ES) :PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DO MATO GROSSO DO

SUL

RECDO.(A/S) :RÔMULO AUGUSTO DUARTE

ADV.(A/S) :ANA KARINA DE OLIVEIRA E SILVA E OUTRO(A/S)

INTDO.(A/S) :UNIÃO

ADV.(A/S) :ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO

INTDO.(A/S) :MUNICIPIO DO RIO DE JANEIRO

PROC.(A/S)(ES) :PROCURADOR-GERAL DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros

do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, sob a presidência do

Senhor Ministro Cezar Peluso, na conformidade da ata do julgamento e

das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, negar provimento ao

recurso extraordinário, nos termos do voto do relator, ministro Gilmar

Mendes.

Brasília, 10 de agosto de 2011.

Ministro GILMAR MENDES

Relator

Documento assinado digitalmente.

Em elaboração

10/08/2011 PLENÁRIO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 598.099 MATO GROSSO DO SUL

RELATOR :MIN. GILMAR MENDES

RECTE.(S) :ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL

PROC.(A/S)(ES) :PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DO MATO GROSSO DO

SUL

RECDO.(A/S) :RÔMULO AUGUSTO DUARTE

ADV.(A/S) :ANA KARINA DE OLIVEIRA E SILVA E OUTRO(A/S)

INTDO.(A/S) :UNIÃO

ADV.(A/S) :ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO

INTDO.(A/S) :MUNICIPIO DO RIO DE JANEIRO

PROC.(A/S)(ES) :PROCURADOR-GERAL DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO

R E L A T Ó R I O

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR): Trata-se de recurso

extraordinário contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça que,

reconhecendo o direito subjetivo à nomeação de candidato aprovado em

concurso público, deu provimento a recurso ordinário em mandado de

segurança, para determinar a nomeação do candidato, com a seguinte

ementa:

“RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA.

ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. DIREITO À

NOMEAÇÃO. CANDIDATO APROVADO ENTRE AS VAGAS

PREVISTAS NO EDITAL. DIREITO LÍQUIDO E CERTO.

RECURSO PROVIDO.

1. A aprovação do candidato no limite do número de

vagas definido no Edital do concurso gera em seu favor o

direito subjetivo à nomeação para o cargo.

2. As disposições contidas no Edital vinculam as

atividades da Administração, que está obrigada a prover os

cargos com os candidatos aprovados no limite das vagas

previstas. A discricionariedade na nomeação de candidatos só

incide em relação aos classificados nas vagas remanescentes.

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O

documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 1390368.

RE 598.099 / MS

3. Não é lícito à Administração, no prazo de validade do

concurso público, simplesmente omitir-se na prática dos atos de

nomeação dos aprovados no limite das vagas ofertadas, em

respeito aos investimentos realizados pelos concursantes, em

termos financeiros, de tempo e emocionais, vem com às suas

legítimas expectativas quanto à assunção do cargo público.

4. Precedentes desta Corte Superior: RMS 15.034/RS e RMS

10.817/MG.

5. Recurso Ordinário provido” (fl. 126).

No caso, cuida-se de concurso público de provas para o cargo de

Agente Auxiliar de Perícia do Estado do Mato Grosso do Sul, de acordo

com o Edital de Publicação Nº 001/2004 – SEGES/SEJUSP/PC. O certame

foi homologado em 27 de dezembro de 2006 e tinha prazo de validade de

01 (um) ano, prorrogável por igual período.

O recorrido foi aprovado dentro do número de vagas estabelecido

no edital, mas não foi nomeado pelo ora recorrente.

Sustenta-se, em síntese, que o acórdão recorrido viola o art. 37, inciso

IV, da Constituição Federal, bem como o princípio da eficiência previsto

no caput desse artigo.

Alega-se, também, que a nomeação do candidato por decisão judicial

gera preterição na ordem de classificação dos demais aprovados.

Defende-se, ainda, o não cabimento de mandado de segurança, por

ausência de direito líquido e certo.

Esses autos foram levados ao Plenário Virtual, pelo então Relator

Min. Menezes Direito, oportunidade em que o Tribunal reconheceu a

existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada.

Em parecer de fls. 264 a 266, a Procuradoria-Geral da República

manifestou-se pelo não provimento do recurso, afirmando que há direito

subjetivo à nomeação do candidato aprovado dentro do número de vagas

especificadas no edital.

É o relatório.

2

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O

documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 1390368.

10/08/2011 PLENÁRIO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 598.099 MATO GROSSO DO SUL

V O T O

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR): A questão central a ser

discutida nestes autos é se o candidato aprovado em concurso público

dentro do número de vagas possui direito subjetivo, ou apenas

expectativa de direito, à nomeação.

Não é de hoje que esta Corte debate acerca do direito à nomeação de

candidato aprovado em concurso público.

Na Sessão Plenária de 13.12.1963, foi aprovada a Súmula 15, cuja

redação é a seguinte:

“Dentro prazo de validade do concurso, o candidato

aprovado tem o direito à nomeação, quando o cargo for

preenchido sem observância da classificação”.

Dos precedentes que originaram essa Súmula (ACi-embargos 7387,

Rel. Min. Orosimbo Nonato, DJ 5.10.1954; RMS 8724, Rel. Min. Cândido

Motta Filho, DJ 8.9.1961; RMS 8578, Rel. Min. Pedro Chaves, DJ 12.4.1962)

extrai-se que a aprovação em concurso dentro das vagas não confere, por

si só, direito à nomeação no cargo.

Assim, pelo menos desde 1954, a Corte já afirmava a mera

expectativa de direito à nomeação do candidato aprovado em concurso

público, transformando essa expectativa em direito subjetivo apenas

quando houvesse preterição na ordem de classificação.

Daí em diante, a jurisprudência tem sido no sentido de que a

aprovação em concurso público não gera, em princípio, direito à

nomeação, constituindo-se em mera expectativa de direito. Nesse sentido

cito: RE-AgR 306.938, Rel. Min. Cezar Peluso, 2ª Turma, DJe 11.10.2007;

RE-AgR 421.938, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, DJ 2.6.2006, este

último assim ementado:

“Concurso público: direito à nomeação: Súmula 15-STF.

Liberado para assinatura

RE 598.099 / MS

Firmou-se o entendimento do STF no sentido de que o

candidato aprovado em concurso público, ainda que dentro do

número de vagas, torna-se detentor de mera expectativa de

direito, não de direito à nomeação: precedentes. O termo dos

períodos de suspensão das nomeações na esfera da

Administração Federal, ainda quando determinado por

decretos editados no prazo de validade do concurso, não

implica, por si só, a prorrogação desse mesmo prazo de

validade pelo tempo correspondente à suspensão”.

A orientação predominante desta Corte, não obstante, reconhece o

direito à nomeação no caso de preterição da ordem de classificação,

inclusive quando provocada por contratação precária.

No recente julgamento da SS-AgR 4196, Rel. Min. Cezar Peluso, DJe

27.8.2010, o Plenário desta Corte, por decisão unânime, entendeu que não

causa grave lesão à ordem pública a decisão judicial que determina a

observância da ordem classificatória em concurso público, a fim de evitar

preterição de concursados pela contratação de temporários, quando

comprovada a necessidade do serviço. O acórdão restou assim ementado:

“SERVIDOR PÚBLICO. CONCURSO PÚBLICO. Cargo.

Nomeação. Preterição da ordem de classificação e contratação

precária. Fatos não demonstrados. Segurança concedida em

parte. Suspensão. Indeferimento. Inexistência de lesão à ordem

pública. Agravo regimental improvido. Não há risco de grave

lesão à ordem pública na decisão judicial que determina seja

observada a ordem classificatória em concurso público, a fim de

evitar preterição de concursados pela contratação de

temporários, quando comprovada a necessidade do serviço”.

Cito também julgados com votações unânimes das duas Turmas da

Corte: AI-AgR 777.644, Rel. Min. Eros Grau, Segunda Turma, decisão

unânime, Dje 14.5.2010; e AI-AgR 440.895, Rel. Min. Sepúlveda Pertence,

Primeira Turma, decisão unânime, DJ 20.10.2006, este último assim

ementado:

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RE 598.099 / MS

“Concurso público: terceirização da vaga: preterição de

candidatos aprovados: direito à nomeação: uma vez

comprovada a existência da vaga, sendo esta preenchida, ainda

que precariamente, fica caracterizada a preterição do candidato

aprovado em concurso. 2. Recurso extraordinário: não se presta

para o reexame das provas e fatos em que se fundamentou o

acórdão recorrido: incidência da Súmula 279”.

Nesse sentido, de acordo com a jurisprudência do STF, a nomeação

de pessoa não aprovada em concurso configura preterição na ordem de

classificação, em detrimento de candidato regularmente aprovado.

A jurisprudência do STF, portanto, tem reconhecido o direito

subjetivo à nomeação apenas nas referidas hipóteses: preterição na ordem

de classificação e nomeação de outras pessoas que não aquelas que

constam da lista classificatória de aprovados no certame público.

Divergindo da antiga jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a

1ª Turma desta Corte teve a oportunidade de afirmar que candidatos

aprovados em concurso público têm direito subjetivo à nomeação para

posse que vier a ser dada nos cargos vagos existentes ou nos que vierem a

existir no prazo de validade do concurso. Assim foi o julgamento do RE

227.480, Relatora para o acórdão Min. Cármen Lúcia, DJe 21.8.2009, do

qual se extrai a seguinte ementa:

“DIREITOS CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO.

NOMEAÇÃO DE APROVADOS EM CONCURSO PÚBLICO.

EXISTÊNCIA DE VAGAS PARA CARGO PÚBLICO COM

LISTA DE APROVADOS EM CONCURSO VIGENTE: DIREITO

ADQUIRIDO E EXPECTATIVA DE DIREITO. DIREITO

SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. RECUSA DA ADMINISTRAÇÃO

EM PROVER CARGOS VAGOS: NECESSIDADE DE

MOTIVAÇÃO. ARTIGOS 37, INCISOS II E IV, DA

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. RECURSO

EXTRAORDINÁRIO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. 1.

Os candidatos aprovados em concurso público têm direito

subjetivo à nomeação para a posse que vier a ser dada nos

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RE 598.099 / MS

cargos vagos existentes ou nos que vierem a vagar no prazo de

validade do concurso. 2. A recusa da Administração Pública em

prover cargos vagos quando existentes candidatos aprovados

em concurso público deve ser motivada, e esta motivação é

suscetível de apreciação pelo Poder Judiciário. 3. Recurso

extraordinário ao qual se nega provimento”.

Na oportunidade, a eminente Min. Cármen Lúcia sustentou que “há

o direito subjetivo à nomeação, salvo se sobrevier interesse público que determine

que, por uma nova circunstância, o que acontecer na hora da convocação ponha

abaixo o edital”.

Alegou, ainda, que não se trata de direito adquirido, mas de direito

líquido e certo, porquanto “o direito subjetivo pode ser afrontado por uma

nova circunstância da Administração que o impeça e, então, não haveria um

ilícito da Administração”. Afirmou também que, caso não haja recursos, e

ainda assim a Administração lance um edital de concurso, haveria de se

responsabilizar o administrador, e não o candidato.

Importante destacar que ficou consignado nesse voto que “a

Administração não fica obrigada a nomear, a não ser que não haja nada de novo

entre o concurso e a realidade e as condições administrativas”.

Apesar de não encampar a tese do direito líquido e certo à nomeação

do candidato aprovado dentro do número de vagas, o Min. Ricardo

Lewandowski fez consignar que não pode a Administração simplesmente

deixar de nomear candidato aprovado sem nenhuma motivação.

O Min. Ayres Britto, acompanhando a divergência inaugurada pela

Min. Cármen Lúcia, defendeu que “os candidatos não podem ficar reféns de

conduta que, deliberadamente, deixa escoar o prazo de validade do concurso,

para, em seguida, prover os cargos mediante nomeação de novos concursados, ou

o que é muito pior, por meio de inconstitucional provimento derivado”.

Afirmou, também, que alterações fáticas podem ensejar mudança de

planos, mas esta deve vir acompanhada de uma justa causa. O que

descaracterizaria o direito adquirido à nomeação.

Na ocasião, o Min. Marco Aurélio também votou no sentido de que

há direito subjetivo à nomeação.

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RE 598.099 / MS

Já há, inclusive, decisão monocrática afirmando esse entendimento.

Cito o RE 633.008, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe 17.12.2010, do qual se

extrai o seguinte trecho:

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ADMINISTRATIVO.

APROVAÇÃO EM CONCURSO NO NÚMERO DE VAGAS.

DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO PARA CARGO.

ACÓRDÃO RECORRIDO EM HARMONIA COM A

JURISPRUDÊNCIA DESTE SUPREMO TRIBUNAL. RECURSO

AO QUAL SE NEGA SEGUIMENTO”.

Recentemente, no RE 581.113, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em

5.4.2011 e noticiado no Informativo nº 622, a 1ª Turma desta Corte

reiterou esse entendimento.

Nesse último caso, o Min. Relator consignou que os recorrentes

foram aprovados fora do número de vagas previstas no edital.

Contudo, por ocasião do surgimento de novas vagas pela Lei

10.842/2004, o TRE de Santa Catarina utilizava-se de servidores cedidos

por outros órgãos da Administração.

Assim, nota-se que, nesse caso, o direito subjetivo surgiu em

decorrência da preterição, uma vez que havia candidatos aprovados em

concurso válido. O que não se tem admitido é a obrigação da

Administração Pública de nomear candidato aprovado fora do número

de vagas previstas no edital, simplesmente pelo surgimento de vaga, seja

por nova lei, seja em decorrência de vacância. Com efeito, proceder dessa

forma seria engessar a Administração Pública, que perderia sua

discricionariedade quanto à melhor alocação das vagas, inclusive quanto

a eventual necessidade de transformação ou extinção dos cargos vagos.

Na Sessão Plenária de 3.2.2011, ao julgar o MS 24.660, o Tribunal, por

maioria, nos termos do voto condutor da Min. Cármen Lúcia, concedeu a

segurança em caso em que se discutia o direito à nomeação da impetrante

no cargo de Promotora da Justiça Militar, em razão da improcedência da

fundamentação apresentada pela Administração.

Nesse julgamento, a Min. Cármen Lúcia, ao tratar do art. 37, inciso

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RE 598.099 / MS

IV, da Constituição Federal, ressaltou que, “nos termos constitucionalmente

postos, não inibe a abertura de novo concurso a existência de candidatos

classificados em evento ocorrido antes. O que não se permite, no entanto, no

sistema vigente, é que, durante o prazo de validade do primeiro, os candidatos

classificados para os cargos na seleção anterior sejam preteridos por aprovados em

novo certame”.

Citou, ainda, o magistério do Professor Celso Antônio Bandeira de

Mello:

“Como o texto (constitucional) correlacionou tal

prioridade ao mero fato de estar em vigor o prazo de validade,

segue-se que, a partir da Constituição, em qualquer concurso

os candidatos estarão disputando tanto as vagas existentes

quando de sua abertura, quanto as que venham a ocorrer ao

longo do seu período de validade, pois, durante esta dilação,

novos concursados não poderiam ocupá-los com postergação

dos aprovados em concurso anterior”. (grifei)

Nessa linha de raciocínio, que segue o caminho dessa nítida

evolução da jurisprudência desta Corte, entendo que o dever de boa-fé da

Administração Pública exige o respeito incondicional às regras do edital,

inclusive quanto à previsão das vagas do concurso público. Isso

igualmente decorre de um necessário e incondicional respeito à

segurança jurídica como princípio do Estado de Direito. Tem-se, aqui, o

princípio da segurança jurídica como princípio de proteção à confiança.

Como esta Corte tem afirmado em vários casos, o tema da segurança

jurídica é pedra angular do Estado de Direito sob a forma de proteção à

confiança. É o que destaca Karl Larenz, que tem na consecução da paz

jurídica um elemento nuclear do Estado de Direito material e também vê

o princípio da confiança como aspecto do princípio da segurança:

“O ordenamento jurídico protege a confiança suscitada

pelo comportamento do outro e não tem mais remédio que

protegê-la, porque poder confiar (...) é condição fundamental

para uma pacífica vida coletiva e uma conduta de cooperação

entre os homens e, portanto, da paz jurídica.” (Derecho Justo –

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RE 598.099 / MS

Fundamentos de Ética Jurídica. Madri. Civitas, 1985, p. 91)

O autor tedesco prossegue afirmando que o princípio da confiança

tem um componente de ética jurídica, que se expressa no princípio da boa

fé. Diz:

“Dito princípio consagra que uma confiança despertada

de um modo imputável deve ser mantida quando efetivamente

se creu nela. A suscitação da confiança é imputável, quando o

que a suscita sabia ou tinha que saber que o outro ia confiar.

Nesta medida é idêntico ao princípio da confiança. (...) Segundo

a opinião atual, [este princípio da boa-fé] se aplica nas relações

jurídicas de direito público”. (Derecho Justo – Fundamentos de

Ética Jurídica. Madri. Civitas, 1985, p. 95 e 96)

Quando a Administração Pública torna público um edital de

concurso, convocando todos os cidadãos a participarem de seleção para o

preenchimento de determinadas vagas no serviço público, ela

impreterivelmente gera uma expectativa quanto ao seu comportamento

segundo as regras previstas nesse edital. Aqueles cidadãos que decidem

se inscrever e participar do certame público depositam sua confiança no

Estado administrador, que deve atuar de forma responsável quanto às

normas do edital e observar o princípio da segurança jurídica como guia

de comportamento. Isso quer dizer, em outros termos, que o

comportamento da Administração Pública no decorrer do concurso

público deve-se pautar pela boa-fé, tanto no sentido objetivo quanto no

aspecto subjetivo de respeito à confiança nela depositada por todos os

cidadãos.

Ressalte-se, no tocante ao tema, que a própria Constituição, no

art. 37, IV, garante prioridade aos candidatos aprovados em concurso, nos

seguintes termos:

“(...) durante o prazo improrrogável previsto no edital de

convocação, aquele aprovado em concurso público de provas

ou de provas e títulos será convocado com prioridade sobre

novos concursados para assumir cargo ou emprego, na

carreira”.

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RE 598.099 / MS

Assim, é possível concluir que, dentro do prazo de validade do

concurso, a Administração poderá escolher o momento no qual se

realizará a nomeação, mas não poderá dispor sobre a própria nomeação,

a qual, de acordo com o edital, passa a constituir um direito do

concursando aprovado e, dessa forma, um dever imposto ao poder

público.

De fato, se o edital prevê determinado número de vagas, a

Administração vincula-se a essas vagas, uma vez que, tal como já

afirmado pelo Min. Marco Aurélio em outro caso, “o edital de concurso,

desde que consentâneo com a lei de regência em sentido formal e material, obriga

candidatos e Administração Pública” (RE 480.129/DF, Rel. Min. Marco

Aurélio, 1ª Turma, DJ 23.10.2009). Nesse sentido, é possível afirmar que,

uma vez publicado o edital do concurso com número específico de vagas,

o ato da Administração que declara os candidatos aprovados no certame

cria um dever de nomeação para a própria Administração e, portanto, um

direito à nomeação titularizado pelo candidato aprovado dentro desse

número de vagas.

Esse direito à nomeação surge, portanto, quando se realizam as

seguintes condições fáticas e jurídicas:

a) previsão em edital de número específico de vagas a serem

preenchidas pelos candidatos aprovados no concurso público;

b) realização do certame conforme as regras do edital;

c) homologação do concurso e proclamação dos aprovados dentro

do número de vagas previsto no edital, em ordem de classificação, por

ato inequívoco e público da autoridade administrativa competente.

O direito à nomeação constitui um típico direito público subjetivo em

face do Estado, decorrente do princípio que a Ministra Cármen Lúcia, em

obra doutrinária, cunhou de princípio da acessibilidade aos cargos

públicos (ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios Constitucionais dos

Servidores Públicos. São Paulo: Saraiva; 1999, p. 143). Na ordem

constitucional brasileira, esse princípio está fundado em alguns

princípios informadores da organização do Poder Público no Estado

Democrático de Direito, tais como:

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RE 598.099 / MS

a) o princípio democrático de participação política, que impõe a

participação plural e universal dos cidadãos na estrutura do Poder

Público, na qualidade de servidores públicos;

b) o princípio republicano, que exige a participação efetiva do cidadão

na gestão da coisa pública;

c) o princípio da igualdade, que prescreve a igualdade de

oportunidades no acesso ao serviço público.

Nesses termos, a acessibilidade aos cargos públicos constitui um

direito fundamental expressivo da cidadania, como bem observou a

Ministra Cármen Lúcia na referida obra.

Esse direito representa, dessa forma, uma das faces mais

importantes do status activus dos cidadãos, conforme a conhecida

“teoria dos status” de Jellinek.

A existência de um direito à nomeação, nesse sentido, limita a

discricionariedade do Poder Público quanto à realização e gestão dos

concursos públicos. Respeitada a ordem de classificação, a

discricionariedade da Administração resume-se ao momento da

nomeação, nos limites do prazo de validade do concurso.

Não obstante, quando se diz que a Administração Pública tem a

obrigação de nomear os aprovados dentro do número de vagas previsto

no edital, deve-se levar em consideração a possibilidade de situações

excepcionalíssimas que justifiquem soluções diferenciadas,

devidamente motivadas de acordo com o interesse público.

Não se pode ignorar que determinadas situações excepcionais

podem exigir a recusa da Administração Pública de nomear novos

servidores. Para justificar o excepcionalíssimo não cumprimento do

dever de nomeação por parte da Administração Pública, uma vez já

preenchidas as condições acima delineadas, é necessário que a situação

justificadora seja dotada das seguintes características:

a) Superveniência: os eventuais fatos ensejadores de uma situação

excepcional devem ser necessariamente posteriores à publicação do

edital do certame público. Pressupõe-se com isso que, ao tempo da

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RE 598.099 / MS

publicação do edital, a Administração Pública conhece suficientemente

a realidade fática e jurídica que lhe permite oferecer publicamente as

vagas para preenchimento via concurso.

b) Imprevisibilidade: a situação deve ser determinada por

circunstâncias extraordinárias, imprevisíveis à época da publicação do

edital. Situações corriqueiras ou mudanças normais das circunstâncias

sociais, econômicas e políticas não podem servir de justificativa para

que a Administração Pública descumpra o dever de nomeação dos

aprovados no concurso público conforme as regras do edital.

c) Gravidade: os acontecimentos extraordinários e imprevisíveis

devem ser extremamente graves, implicando onerosidade excessiva,

dificuldade ou mesmo impossibilidade de cumprimento efetivo das

regras do edital. Crises econômicas de grandes proporções, guerras,

fenômenos naturais que causem calamidade pública ou comoção

interna podem justificar a atuação excepcional por parte da

Administração Pública.

d) Necessidade: a solução drástica e excepcional de não

cumprimento do dever de nomeação deve ser extremamente necessária.

Isso quer dizer que a Administração somente pode adotar tal medida

quando absolutamente não existirem outros meios menos gravosos

para a lidar com a situação excepcional e imprevisível. Em outros

termos, pode-se dizer que essa medida deve ser sempre a ultima ratio

da Administração Pública.

Tais características podem assim servir de vetores hermenêuticos

para o administrador avaliar, com a devida cautela, a real necessidade de

não cumprimento do dever de nomeação.

De toda forma, o importante é que essa recusa de nomear candidato

aprovado dentro do número de vagas seja devidamente motivada e,

dessa forma, seja passível de controle pelo Poder Judiciário.

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RE 598.099 / MS

Ressalte-se que o dever da Administração e, em consequência, o

direito dos aprovados, não se estende a todas as vagas existentes, nem

sequer àquelas surgidas posteriormente, mas apenas àquelas

expressamente previstas no edital de concurso. Isso porque cabe à

Administração dispor dessas vagas da forma mais adequada, inclusive

transformando ou extinguindo, eventualmente, os respectivos cargos.

Se a Administração, porém, decide preencher aquelas vagas por

meio do necessário concurso, o princípio da boa-fé impõe-se: as vagas

devem ser preenchidas pelos aprovados no certame.

Quanto à alegação de que a nomeação por determinação judicial

implica preterição na ordem de classificação dos demais aprovados, o

recorrente tampouco tem razão. É pacífica a jurisprudência desta Corte

no sentido de que não se configura preterição quando a Administração

realiza nomeações em observação a decisão judicial. Nesse sentido, cito os

seguintes precedentes: RE-AgR 594.917, Rel. Min. Ricardo Lewandowski,

1ª Turma, DJe 25.11.2010; AI-AgR 620.992, Rel. Min. Cármen Lúcia, 1ª

Turma, decisão unânime, DJe 29.6.2007; RE-AgR 437.403, de minha

relatoria, 2ª Turma, decisão unânime, DJ 5.5.2006.

No que se refere à alegação de indisponibilidade financeira para

nomeação de aprovados em concurso, o Pleno afirmou a presunção de

existência de disponibilidade orçamentária quando há preterição na

ordem de classificação, inclusive decorrente de contratação temporária.

Nesse sentido, cito a ementa da SS-AgR 4189, Rel. Min. Cezar Peluso, DJe

13.8.2010:

“SERVIDOR PÚBLICO. Cargo. Nomeação. Concurso

público. Observância da ordem de classificação. Alegação de

lesão à ordem pública. Efeito multiplicador. Necessidade de

comprovação. Contratação de temporários. Presunção de

existência de disponibilidade orçamentária. Violação ao art. 37,

II, da Constituição Federal. Suspensão de Segurança indeferida.

Agravo regimental improvido. Não há risco de grave lesão à

ordem pública na decisão judicial que determina seja observada

a ordem classificatória em concurso público, a fim de evitar a

preterição de concursados pela contratação de temporários,

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RE 598.099 / MS

quando comprovada a necessidade do serviço”.

Destaque-se que as vagas previstas em edital já pressupõem a

existência de cargos e a previsão na Lei Orçamentária, razão pela qual a

simples alegação de indisponibilidade financeira, desacompanhada de

elementos concretos, tampouco retira a obrigação da administração de

nomear os candidatos aprovados.

Também não incide, na espécie, o óbice do § 2º do art. 7º da Lei

12.016/2009. Assim é a jurisprudência desta Corte, no sentido de que o

pedido de nomeação e posse em cargo público para o qual o candidato

fora aprovado em concurso público, dentro do número de vagas, não se

confunde com o pagamento de vencimentos, que é mera consequência

lógica da investidura no cargo para o qual concorreu. Nessa toada, cito

Rcl 6138, Rel. Min. Cármen Lúcia, decisão unânime deste Plenário, DJe

18.6.2010, assim ementado:

“RECLAMAÇÃO. TUTELA ANTECIPADA EM

MANDADO DE SEGURANÇA. NOMEAÇÃO DE

CANDIDATA APROVADA EM CONCURSO PÚBLICO

DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS. DESCUMPRIMENTO DA

DECISÃO PROFERIDA NA MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO

DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE N. 4/DF.

INOCORRÊNCIA. RECLAMAÇÃO IMPROCEDENTE. 1. O

pedido de nomeação e posse em cargo público para o qual a

candidata fora aprovada em concurso público, dentro do

número de vagas, não se confunde com o pagamento de

vencimentos, que é mera conseqüência lógica da investidura no

cargo para o qual concorreu. 2. As conseqüências decorrentes

do ato de nomeação não evidenciam desrespeito à decisão

proferida nos autos da Ação Declaratória de

Constitucionalidade n. 4/DF. Precedentes. 3. Reclamação

julgada improcedente, prejudicado o exame do agravo

regimental”.

Em síntese, entendo que a Administração Pública está vinculada às

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RE 598.099 / MS

normas do edital, ficando inclusive obrigada a preencher as vagas

previstas para o certame dentro do prazo de validade do concurso. Essa

obrigação só pode ser afastada diante de excepcional justificativa, o que,

no caso, não ocorreu.

Por fim, deixo consignado que esse entendimento, na medida em

que atesta a existência de um direito subjetivo à nomeação, reconhece e

preserva da melhor forma a força normativa do princípio do concurso

público, que vincula diretamente a Administração. É preciso reconhecer

que a efetividade da exigência constitucional do concurso público, como

uma incomensurável conquista da cidadania no Brasil, permanece

condicionada à observância, pelo Poder Público, de normas de

organização e procedimento e, principalmente, de garantias

fundamentais que possibilitem o seu pleno exercício pelos cidadãos.

O reconhecimento de um direito subjetivo à nomeação deve passar a

impor limites à atuação da Administração Pública e dela exigir o estrito

cumprimento das normas que regem os certames, com especial

observância dos deveres de boa-fé e incondicional respeito à confiança

dos cidadãos.

O princípio constitucional do concurso público é fortalecido quando

o Poder Público assegura e observa as garantias fundamentais que

viabilizam a efetividade desse princípio. Ao lado das garantias de

publicidade, isonomia, transparência, impessoalidade, entre outras, o

direito à nomeação representa também uma garantia fundamental da

plena efetividade do princípio do concurso público.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso extraordinário para

manter o acórdão recorrido.

É como voto.

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10/08/2011 PLENÁRIO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 598.099 MATO GROSSO DO SUL

EXPLICAÇÃO

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR) - Senhor

Presidente, como já foi ressaltado aqui, está em jogo o princípio do

concurso público. Nós estamos apenas desenvolvendo esse princípio no

sentido de lhe dar maior força normativa ou maior efetividade. E uma

das dimensões que nós percebíamos que faltava efetividade era

exatamente esta invocação da discricionariedade quanto à nomeação,

como já foi dito pela Ministra Cármen Lúcia, para nulificar esse direito.

De modo que, nesses limites – o Tribunal já havia feito uma série de

construções, como eu havia dito, no que diz respeito especialmente às

situações de pretensão –, eu entendo que, de fato, nós estamos a falar

realmente de uma situação que pode ser caracterizada como direito

subjetivo, a não ser que uma outra situação, ou até um valor de índole

constitucional, possa eventualmente afetar o exercício legítimo desse

direito. Tanto é que nós falamos de situações que levam, realmente, à

impossibilidade de realização desse direito.

O Ministro Lewandowski citou a situação de crise econômica séria

que, agora, afeta vários países. Quem acompanha a mídia internacional

vê o que está acontecendo, por exemplo, na Grécia, com afetação direta

dos salários dos servidores públicos.

Nós tivemos um encontro, Presidente, Vossa Excelência há de se

lembrar, das Cortes Constitucionais, em janeiro deste ano, no Rio de

Janeiro, e o nosso Colega Rui Moura Ramos estava preocupado com uma

determinação, que vinha da União Europeia, que determinava uma

redução de dez por cento nos salários pagos para os servidores públicos

em Portugal. E ele então estava a discutir agora o enquadramento disso

no âmbito da magistratura, que lá goza, como aqui, da irredutibilidade de

vencimentos; vejam, afetando situações já constituídas.

A Ministra Cármen Lúcia deu o exemplo de um projetado concurso

público para atividades que agora já não estão sob a competência do

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RE 598.099 / MS

Estado-membro, o concurso que já foi até realizado, mas agora se diz que

essa função não é mais do Estado-membro, não cabe mais ao Estadomembro

cuidar, por exemplo, dessa seara da educação. Logo, nós temos

um elemento jurídico superveniente que nulifica essa possibilidade.

Então, parece-me que é preciso avançar.

É claro que, de novo, nós estamos aqui a fazer um experimentalismo

institucional, tentando dar um passo no sentido de limitar esse poder,

que, de outra maneira, fica realmente quase que absoluto. Pode ocorrer,

nós sabemos bem, mudança simplesmente de orientação política entre

uma administração e outra, na sucessão normal, que diz que não vai mais

honrar aquele concurso que foi realizado, quando isso tem que estar

dentro de um projeto, de um planejamento. É isto que nós estamos

dizendo: não, nesse caso não pode, como também quando não houver

qualquer motivação.

E o caso aqui é simples, como mostrou o Ministro Marco Aurélio,

porque sequer esboço de motivação existia. Mas eu prefiro falar,

realmente, na caracterização de um direito subjetivo à nomeação.

O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI - Apenas

uma pequena intervenção. Eu fiquei um pouco preocupado - e sei que

não foi essa a intenção de Vossa Excelência - no sentido de se concluir

aqui, neste Plenário, que a Administração devesse fazer uma motivação

semelhante àquela necessária para a abertura de créditos extraordinário,

por exemplo, a que se refere o artigo 167, § 3º, da nossa Constituição. Ou

seja, uma despesa imprevisível que ocorre em caso de guerra, comoção

interna, calamidade pública. Essa seria uma situação extrema.

Eu penso, com o devido respeito, que há de haver essa

imprevisibilidade, mas não com esse grau extremo.

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR) - Não.

Eu só tentei mostrar casos em que a própria Constituição já prevê essa

configuração ou esse tipo de situação, porque também não bastará

qualquer justificativa.

A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Ela pode ser

insuficiente, e a sindicabilidade judicial tem que acontecer.

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RE 598.099 / MS

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR) - E

obviamente não se podem alegar fatos que já eram anteriormente

conhecidos. Daí a necessidade de que haja essa imprevisibilidade, de que a

situação que se tenha configurado seja de fato superveniente. Em suma, é

preciso dar alguma baliza para que não se pretenda simplesmente

esvaziar essa faculdade, esse poder de direito, com qualquer invocação de

não intenção da Administração de agora prover os cargos existentes.

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10/08/2011 PLENÁRIO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 598.099 MATO GROSSO DO SUL

VOTO

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO (PRESIDENTE) - Eu

também vou acompanhar o belo voto do eminente Ministro Relator, e

dizer que o voto de Sua Excelência me permitiu, eu não diria uma

inflexão no meu raciocínio, mas uma oportunidade para sistematizar

algumas idéias que estavam subjacentes a várias manifestações que fiz em

precedentes. Eu quero retomar aqui a partir do que me parece que de

certo modo inspira o voto de Sua Excelência - se eu estiver errado, Vossa

Excelência me corrigirá -, que esse tema, como vários outros, tem que ser

olhado primariamente do ponto de vista da funcionalidade da

Administração Pública. Noutras palavras, quando se prevê, na

Constituição ou fora da Constituição, uma disciplina do concurso

público, é porque se trata de um meio absolutamente necessário para a

funcionalidade, a operacionalidade, na Administração Pública, da

máquina que interessa, portanto, a toda a sociedade. Então, é a partir

desses requisitos de operacionalidade, de eficiência da Administração em

resposta às exigências da sociedade em função do funcionamento da

máquina pública é que o concurso público aparece como alguma coisa

dentro da qual a Administração Pública não pode ter arbítrio. Por que?

Porque se ela própria abre um concurso público, a presunção é de que há

absoluta necessidade de pessoas habilitadas, e, cuja habilitação seja

reconhecida num concurso público, para o desempenho de atividades de

serviços públicos.

De fato, essa é uma situação que não corresponde àquela velha ideia

de discricionariedade - e nisso tem razão a Ministra Cármen Lúcia e, de

certo modo, também, o Ministro Carlos Britto . Porque eu recordo num

voto que já proferi, há muito tempo, no Tribunal de Justiça de São Paulo,

invocando a lição de um processualista penal italiano, que é Franco

Cordeiro, num livro que provavelmente deve ter sido a sua tese de

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RE 598.099 / MS

cátedra, quando ele dizia que na verdade a noção de discricionariedade

se radica, em última análise, na existência de algum dever jurídico - isso é

fora de dúvida. Há, em toda situação dita de exercício de poder

discricionário, uma situação jurídica em que se reconhece um dever

jurídico da Administração Pública, e, ele se propõe aqui, neste caso.

Então, eu acho que o eminente Relator e todos os demais votos que o

acompanharam têm toda razão quando assentam que a Administração

Pública tem um dever jurídico de nomeação dentro do quadro das vagas

postas em concursos, aprovadas num concurso válido e homologado,

dentro do prazo de eficácia do concurso. Então, isso não tenho nenhuma

dúvida. O que é que pode excluir esse dever, ou pode justificar o

"inexercício" desse dever? É que, na verdade, como Sua Excelência disse,

é preciso que haja alegação e prova da superveniência imprevisível de

algum interesse público impeditivo da nomeação. E nisso vai a alegação,

significa, portanto, que a Administração Pública tem que dar os motivos

de um modo objetivo que permita o controle dessa motivação por parte

do Poder Judiciário, e, por via de consequência, por parte da própria

sociedade. Quando, portanto, o Tribunal, em vários precedentes, alude às

hipóteses - como a da preterição, que é objeto da Súmula nº 15, ou nos

outros casos de nomeações precárias, designações provisórias, etc. -,

alude a quê? Alude a algumas das causas possíveis que provam a

inexistência desse motivo superveniente.Quando há preterição, está

provado que não há causa superveniente. Quando a Administração

Pública, ao invés de nomear os aprovados, recorre a terceiros, ou a

situações provisórias na Administração Pública, está demostrado ipso

facto que não há causa superveniente que justifique a não nomeação dos

aprovados.

Muito bem, agora, vistas as coisas do ponto de vista da

Administração Pública, se encarada a posição da situação jurídica

subjetiva dos aprovados no concurso, tampouco podemos deixar de

reconhecer duas coisas: uma, que a esse dever da Administração Pública

corresponde o direito subjetivo dos aprovados. É claro que isto tem

repercussão direta no seu patrimônio, na sua esfera jurídica, e, por isso,

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ele pode invocar esse direito, e será líquido e certo, não dependendo da

prova; mas não deixa de ser o direito subjetivo, como alguma coisa que

integra o seu patrimônio jurídico individual. Mas há também uma coisa

muito interessante: de certo modo, esse direito público subjetivo do

aprovado reflete o interesse público da sociedade em relação ao

preenchimento das vagas necessárias ao exercício dos serviços e

atividades públicas. Em outras palavras, quer dizer: é o aspecto de

cidadania que se alia, também, à situação jurídica individual e que

justifica que ele invoque esse direito, que não é apenas seu, mas, de um

modo mais genérico, atinge também a toda a sociedade. Vossa Excelência

queria fazer alguma observação?

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR) - Senhor

Presidente, é exatamente esse aspecto. E, nesse sentido, no nosso estágio

institucional, o Brasil se diferencia de muitos outros países, ao consagrar

esse princípio do concurso público. O notável jurista argentino Zaffaroni,

por exemplo, chama a atenção para o fato de, no Brasil, já se realizar, há

muitos anos, concurso público para juiz, criando, portanto, uma carreira

profissional. Isso não é comum, sabemos, nos nossos vizinhos, nem em

muitos outros países do nosso estágio civilizatório.

Quando vemos também, Presidente, denúncias, fatos de

malversação de recursos no âmbito da Administração, em geral, isso está

associado, às vezes, à excessiva politização do provimento de cargos

públicos. E, aí, Vossa Excelência, inclusive, quando fala nessa

funcionalidade objetiva, está chamando a atenção para esse elemento de

moralidade pública que envolve o próprio concurso público. Não é

comum ter funcionário público de carreira envolvido em processos de

malversação, de má aplicação de recursos. Portanto, no momento em que

estamos vivendo de inúmeras distorções desse tipo de prática, é

importante e até simbólico que o Tribunal esteja a se pronunciar sobre o

tema.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO - Por isso eu disse que o

concurso público não é responsável pelas mazelas vivenciadas. Não é.

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO (PRESIDENTE) - Eu

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diria, nessa linha de raciocínio de Vossa Excelência, que, portanto, desse

ponto de vista, o reconhecimento de direito subjetivo aos aprovados no

concurso, de certo modo, é um instrumento de uma demanda social de

um exercício legal de comportamento da Administração Pública. Noutras

palavras, o aprovado no concurso, quando invoca o seu direito subjetivo

individual, ele também, de certo modo, obriga a Administração Pública a

ser leal ao que o ordenamento jurídico lhe impõe.

Eu ainda estou na tese, aqui, vou tecer logo a hipótese, mas gostaria

de fazer apenas uma observação que, no caso, pode ter uma outra

solução, e que, teoricamente, pode criar problemas. Primeiro, é a hipótese

do segundo concurso público enquanto ainda vige o prazo de eficácia do

primeiro. Acho que, em caráter absoluto, isso não significa

necessariamente uma causa não excludente do dever. Podem surgir

razões, como, por exemplo, de ordem tecnológica, ou de racionalização

do próprio serviço, além de mudança de competência, etc., que justifique

o não aproveitamento dos aprovados no primeiro concurso, em razão de

um fato superveniente que justifique que se faça um novo concurso,

porque novos requisitos ou condições de habilidade passam a ser

exigidos. Então, é preciso examinar caso a caso para saber quando se

justifica ou não.

O segundo, me parece ser preciso que o Tribunal tome alguma

postura, provavelmente não seria nesse caso, mas, enfim, fica, aí, como

uma lembrança para o Tribunal refletir a respeito: o reconhecimento do

direito subjetivo dos aprovados, mediante uso do mandado de segurança,

supõe que o impetrante ou alegue que está na ordem de classificação, ou,

então, ele tem de atuar em nome do terceiro nos termos do artigo 3º, da

Lei nº 12.016, que já repetia o disposto no artigo 3º da velha lei, que dizia

que, quando ele for titular de um direito dependente ou derivado, ele

pode impetrar o mandado de segurança, sim, invocando direito líquido e

certo em relação ao direito originário de quem o precede na lista de

classificação. Noutras palavras, ele não pode pedir o mandado de

segurança para ele ser nomeado fora da ordem de classificação, mas, sim,

para que a Administração Pública obedeça a ordem de classificação.

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O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO - Mas, aí, ele poderá ser

prejudicado pela inércia do melhor classificado.

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO (PRESIDENTE) - Isso é

o que a lei prevê expressamente, porque não se trata do direito dele,

quando a Administração tem que nomear, deve nomear na ordem. Não

posso pegar o quadragésimo da lista, que impetrou o mandado de

segurança, e nomeá-lo com preterição dos outros trinta e nove. É essa a

atenção que os impetrantes devem ter em relação ao uso do mandado de

segurança nessas situações, em que qualquer um do quadro de aprovados

pode impetrar o mandado de segurança, mas, dependendo da sua

situação, ele tem de se valer da situação ou dos termos em que o prevê o

artigo 3º. Essa é a tese com a qual estou, inteiramente, de acordo.

Agora, na hipótese, além de todas essas razões teóricas, temos dois

casos interessantes. O primeiro: nada foi alegado pela Administração

Pública em relação à posição ou à classificação do impetrante. A

Administração Pública não disse nada. Podia ter dito: "- Ele é o último

classificado, ele não tem direito." Ela se calou. Como se calou, isso só

reforça a argumentação do Tribunal sobre aquilo que consta da petição

inicial. Na petição inicial, consta que o setor administrativo está se

valendo de estagiários da bolsa universitária e de guardas-mirins para

exercer as funções de oficiais de perícia. E, aí, um pouco mais adiante,

também se alega, e a Administração Pública não contesta, que designou

servidores lotados em outros órgãos do serviço público - é o que se vê -,

dos bombeiros militares e policiais militares, desviados das atividades

fins das respectivas corporações para poder compor os quadros da

perícia. Em outras palavras, a Administração Pública não nega que há a

necessidade da nomeação e agora alega que não existe obrigação, etc.

Razões pelas quais, pedindo vênia pelo adiantado da hora, mas me

parecia ser um assunto que, implicando de certo modo uma mudança

substantiva da jurisprudência da Corte, merecia maior consideração.

De modo que eu também, mais uma vez, elogiando, como não podia

deixar de ser, o voto brilhantíssimo do Ministro Relator e de todos os

demais que o acompanharam, também nego provimento ao recurso.

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