quarta-feira, 17 de julho de 2013

Advogado. Assistência judiciária gratuita. Advogado particular.


|STJ - Rec. Esp. 1.153.163 - Rel.: Minª. Nancy Andrighi
 
Advogado. Assistência judiciária gratuita. Advogado particular. 
Contratação pela parte. Honorários advocatícios ad exito. Verba devida. 
Natureza jurídica de alimentos. Valor social do trabalho. Precedentes do 
STJ. Lei 1.060/1950, art. 3º, V. Lei 89.906/1994, arts. 22, § 2º e 23. 
CPC, art. 20. CF/88, arts. 1º, IV e 5º, LXXIV.
 
Nada impede a parte de obter os benefícios da assistência judiciária 
eser representada por advogado particular que indique, hipótese em que, 
havendo a celebração de contrato com previsão de pagamento de honorários 
ad exito, estes serão devidos, independentemente da sua situação 
econômica ser modificada pelo resultado final da ação, não se aplicando 
a isenção prevista no art. 3º, V, da Lei 1.060/1950, presumindo-se que a 
esta renunciou. 2. Recurso especial provido.»
 
... Cinge-se a lide a determinar se a assistência judiciária gratuita 
isenta o beneficiário do pagamento dos honorários advocatícios 
contratuais.
Inicialmente, ressalto que, apesar de não ter mencionado de forma 
expressa os arts. 22, § 2º, e 23 da Lei 8.906/94, constata-se o 
prequestionamento implícito desses dispositivos legais pelo TJ/RS, na 
medida em que o tema atinente à exigibilidade dos honorários 
advocatícios foi objetivamente apreciado pelo acórdão recorrido.
 
O benefício da assistência judiciária gratuita, previsto na Lei 
1.060/1950, tem como principal escopo assegurar a plena fruição da 
garantia constitucional de acesso à Justiça, prevista no art. 5º, XXXV, 
da CF/88, mediante a superação de um dos principais obstáculos ao 
ajuizamento de uma ação, consistente no custo financeiro do processo, 
que inclui despesas processuais e extraprocessuais, bem como os 
honorários advocatícios.
 
Diante disso, o art. 4º da Lei 1.060/1950 faculta a qualquer pessoa o 
gozo dos benefícios da assistência judiciária, mediante simples 
afirmação de que se encontra em situação econômica que lhe impede de 
arcar com as custas do processo e com os honorários de advogado, sem 
prejuízo
próprio ou de sua família.
 
Esta Corte, ciente do seu papel institucional de garantidor da 
cidadania, tem interpretado o referido benefício de forma abrangente, 
estendendoo, por exemplo, às pessoas jurídicas que demonstrem a 
impossibilidade de custear os encargos do processo (EREsp 321.997/MG, 
Corte
Especial, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJ de 16.08.2004) ou, ainda, 
reputando válido o seu deferimento emqualquer fase do processo, desde 
que demonstrado o preenchimento dos requisitos exigidos em lei (AgRg nos 
EDcl no Ag 728.657/SP, 3ª Turma, minha relatoria, DJ de 02.05.2006; e 
REsp 723.751/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 06.08.07).
Referência(s): • 321.997/STJ (Assistência judiciária. Justiça gratuita. 
Pessoa jurídica. Possibilidade. Irrelevância se possui fins beneficentes 
ou lucrativos. Precedentes do STJ. Lei 1.060/1950, art. 2º, parágrafo 
único).
. .
No que concerne especificamente à controvérsia dos autos, porém, o STJ 
ainda não consolidou o seu entendimento.
Há precedentes defendendo que a natureza do instituto, de mecanismo 
facilitador do acesso à justiça, aliada à própria literalidade do art. 
3º, V, da Lei 1.060/1950 – que não distingue os honorários sucumbenciais 
dos convencionais – impõe seja a isenção aplicada também aos honorários
advocatícios contratados. Confira-se, à guisa de exemplo, o precedente 
mencionado no próprio acórdão recorrido, REsp 309.754/MG, 4ª Turma, Rel. 
Min. Hélio Quaglia Barbosa, DJ de 11.02.2008.
Outros julgados, mantendo-se na linha de raciocínio da tese anterior, 
mas avançando nainterpretação sistemática da norma, sustentam que, à 
semelhança do que ocorre com os honorários sucumbenciais, os honorários 
convencionais somente serão exigíveis nas hipóteses em que o êxito na 
ação venha a modificar a condição financeira da parte, nos termos do 
art. 12 daLei 1.060/1950. Nesse sentido: RMS 6.988/RJ, 2ª Turma, Rel. 
Min. Ari Pargendler, DJ de 21.06.1999; e REsp 238.925/SP, 3ª Turma, Rel. 
Min. Ari Pargendler, DJ de 21.08.2001).
 
Filio-me, porém, a uma terceira corrente, entendendo que a escolha de 
um determinado advogado, mediante a promessa de futura remuneração em 
caso de êxito na ação, impede que os benefícios da Lei 1.060/1950 
alcancem esses honorários, dada a sua natureza contratual e 
personalíssima. Dessa forma, independentemente da situação econômica da 
parte ser modificada pelo resultado final da ação, havendo êxito, os 
honorários convencionais serão devidos.
 
Inclusive, foi esta a tese acolhida à unanimidade no julgamento do REsp 
965.350/RS, de minha relatoria, DJ de 03.02.2009, alçado a paradigma 
pelo recorrente.
 
Essa solução harmoniza o direito do advogado de receber o valor 
referente aos serviçosprestados com a faculdade de o beneficiário, 
mediante a celebração do denominado «contrato de risco». (em que o 
pagamento dos honorários se condiciona ao êxito no processo), escolher o 
profissional que considera ideal para a defesa de seus interesses.
 
Vale dizer, se a parte, a despeito de poder se beneficiar da 
assistência judiciária gratuita, opta pela escolha de um advogado 
particular em detrimento daqueles postos à sua disposição gratuitamente 
pelo Estado (a quem incumbe, nos termos do art. 5º, LXXIV, da CF/88, a 
assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem 
insuficiência de recursos), cabe a ela arcar com os ônus decorrentes 
desta escolha deliberada e voluntária.
 
Conforme destaquei em voto vista proferido no julgamento do aludido 
REsp 238.925/SP, uma vez realizado o contrato de prestação de serviços 
advocatícios «entende-se que a parte, embora 'necessitada', renunciou a 
um dos benefícios da assistência judiciária (a isenção do
pagamento da verba honorária). Não pode, portanto, deixar de cumprir a 
obrigação que livremente escolheu pactuar – pois poderia valer-se de 
serviços advocatícios gratuitos, por lei – alegando estado que já 
existia ao tempo dacelebração do pacto: situação econômica precária».
 
Com efeito, ainda que faça jus à assistência judiciária gratuita, a 
contratação de um advogado decorre da livre manifestação de vontade da 
parte, que certamente negociará o valor dos respectivos honorários em 
função da sua condição financeira (ou pelo menos da expectativa de ganho 
em caso de êxito na ação), não se podendo falar em supressão ou 
tolhimento da garantia constitucional de acesso à justiça.
 
Valiosa, nesse ponto, a lição de José Carlos Barbosa Moreira, de que «o 
fato de obtero benefício da gratuidade de maneira alguma impede o 
necessitado de fazer-se representar por profissional liberal. Se o seu 
direito abrange ambos os benefícios - isenção de pagamentos e a 
prestação de serviços -, nada obsta a que ele reclame do Estado apenas o 
primeiro. É antijurídico impor-lhe o dilema: tudo ou nada». (O direito à 
assistência jurídica: evolução no ordenamento brasileiro de nosso tempo. 
Revista de processo, São Paulo, Ano XVII, nº 67, jul/set 1992, p. 130) 
(sem grifos no original).
 
Ademais, como os honorários ad exito pressupõem o efetivo ganho da 
ação, a parte somente irá dispor de numerário depois que já tiver a 
contrapartida pela sua vitória, de sorte que sua situação financeira não 
será negativamente afetada, salvo se a verba honorária for fixada em 
valor abusivo, hipótese em que, por óbvio, poderá ser revista 
judicialmente.
 
Acrescente-se, ainda, que o recebimento dos honorários, cuja natureza 
alimentar já foi reconhecida não só pelo STJ (EREsp 706.331/PR, Rel. 
Min. Humberto Gomes de Barros, Corte Especial, DJ 31.03.2008), mas 
também pelo STF (RE 470.407/DF, 1ª Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 
13.10.2006; e RE 146.318/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 
04.04.1997), constitui direito do advogado, previsto expressamente no 
art. 22 da Lei 8.906/94 e que deve ser respeitado, sob pena de 
vilipendiar o valorsocial do trabalho, expresso no art. 1º, IV, da 
CF/88.
Referência(s): • 706.331/STJ (Honorários advocatícios. Advogado. 
Sucumbência. Alimentos. Natureza jurídica alimentar. CPC, art. 20. Lei 
11.033/2004, art. 19, I. Lei 8.906/94, arts. 22, 23 e 24).
. .
Finalmente, cumpre frisar que a hipótese dos autos não se equipara à do 
advogado dativo.
Como bem destaca Euro Bento Maciel, o paralelo não se coaduna com a 
sistemática daassistência judiciária, que é distinta da justiça 
gratuita.
Para o autor, na 'assistência judiciária' o Estado assume, pelo 
beneficiário, a obrigação de arcar com as despesas processuais e 
honorários advocatícios do patrono, que é nomeado pelo Juízo ou pela 
Ordem dos Advogados do Brasil, sem que lhe assista direito à livre 
escolha do profissional, enquanto que, na 'justiça gratuita' a isenção 
suportada pelo Estado serestringe às despesas processuais, sendo o 
patrono escolhido constituído e remunerado pelo próprio cliente». 
(Justiça gratuita e assistência judiciária. Honorários de advogado, in 
Revista do Advogado, nº 59, p. 63-69).
 
Embora essa divisão conceitual não conste da Constituição tampouco da 
Lei 1.060/1950, ela é útil para apontar a necessidade de se diferenciar 
a aplicação das isenções previstas no art. 3º da referida Lei, nas 
hipóteses em que o beneficiário seja representado por funcionário do 
serviço
organizado de assistência judiciária, ou por advogado dativo, e nos 
casos em que indique advogado, celebrando com ele contrato remunerado de 
prestação de serviços.
 
Em síntese, nada impede a parte de obter os benefícios da assistência 
judiciária e ser representada por advogado particular que indique, 
hipótese em que, havendo a celebração de contrato com previsão de 
pagamento de honorários ad exito, estes serão devidos, independentemente 
da sua situação econômica ser modificada pelo resultado final da ação, 
não se aplicando a isenção prevista no art. 3º, V, da Lei 1.060/1950, 
presumindo-se que a esta renunciou.
 
Logo, não constatada qualquer barreira ao recebimento dos honorários 
contratuais por parte do advogado que assistiu a parte beneficiária da 
assistência judiciária gratuita, merece reforma o acórdão recorrido.
 
Todavia, considerando tratar-se de ação de arbitramento de honorários, 
havendo inclusive laudo pericial produzido nos autos para esse fim, fica 
inviabilizada a aplicação do direito à espécie, por depender do 
revolvimento do acervo fático-probatório dos autos.
 
Assim, não resta alternativa senão a devolução dos autos ao TJ/RS para 
que prossiga na esteira do devido processo legal e arbitre os honorários 
advocatícios.
 
Forte nessas razões, DOU PROVIMENTO ao recurso especial, determinando 
abaixa dos autos à origem para arbitramento dos honorários advocatícios.
 
STJ - Rec. Esp. 1.153.163 - Rel.: Minª. Nancy Andrighi
 

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