terça-feira, 21 de maio de 2013

CAOP da Criança e do Adolescente - 12 de junho - Dia mundial de combate ao Trabalho Infantil,Fonte CD Acervo - Direitos da Criança e do Adolescente Viviane Colucci - Procuradora Regional do Trabalho.


CAOP da Criança e do Adolescente

12 de junho - Dia mundial de combate ao Trabalho Infantil

__ 3 - Doutrina

____ 3.1 - A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO NO COMBATE AO TRABALHO INFANTIL ATRAVÉS DOS FÓRUNS TEMÁTICOS

3.1 - A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO NO COMBATE AO TRABALHO INFANTIL ATRAVÉS DOS FÓRUNS TEMÁTICOS

Fonte CD Acervo - Direitos da Criança e do Adolescente

Viviane Colucci

Procuradora Regional do Trabalho.

1. A Problemática da Criança e seu enfrentamento por meio do trabalho em rede : A criação dos Fóruns Temáticos :

A erradicação do trabalho infantil e a proteção do adolescente no trabalho constituem questões a serem enfrentadas conforme a concepção ditada pela teoria da proteção integral, consagrada pelo texto da Constituição Federal de 1988.

A Convenção sobre os Direitos da Criança, assinada em Nova York, em 1989, assim definiu a inovadora doutrina:

"A humanidade deve dar à criança o melhor que lhe pode dar (...).

A criança gozará de uma proteção especial e disporá de oportunidades e serviços, proporcionados pela lei e por outros meios, para que possa desenvolver-se física, mental, moral, espiritual e socialmente de forma saudável e normal, assim como em condições de liberdade e dignidade. A criança deve ser protegida contra toda forma de abandono, crueldade e exploração".

Destaca-se, ainda, que a gestão de atendimento à infância e à juventude passou a ter por diretrizes, a partir do advento da Constituição de 1988, "a descentralização político-administrativa" e a "participação popular por meio de suas organizações representativas, na formulação de políticas e no controle das ações de todos os níveis" (art. 204, CF).

Já no período militar, articulava-se um conceito de sociedade civil inspirado na concepção gramsciana, que veio a exercer influência sobre os primeiros movimentos de base que emergiam. A hegemonia não seria conquistada apenas através da coerção estatal, mas, antes de tudo, no plano da sociedade civil, o que não negaria a premissa fundamental marxiana da materialidade genética da superestrutura, nesta incluída a sociedade civil. (Costa, Sérgio, Categoria Analítica ou Passe-Partout Político-Administrativo? A Trajetória do Conceito de Sociedade Civil no Brasil, pág. 3 (texto mimeo.)

O que se verifica atualmente é que a sociedade civil vem ganhando os espaços não preenchidos pelo Estado, com discursos e atuações que não poderiam ser ocupados por este. Constata-se que os novos mecanismos legais instituídos pela Constituição viabilizam a influência de setores da sociedade civil que não são abrangidos pelo Estado. Como lembra Sérgio Costa, "alguns setores da sociedade civil vivem fora da região de abrangência do Estado constitucional, considerados aparatos de poder pontuais, onde se formulam ad hoc e distantes do processo político códigos de honra e comportamento impostos a grupos sociais desprotegidos e impossibilitados de qualquer reação efetiva" (Costa, Sérgio. Categoria Analítica ou Passe-Parlout Político-Administrativo? A Trajetória do Conceito de Sociedade Civil no Brasil, pág. 10) (texto mimeo.).

Nesta dimensão, ressalta Lizt Vieira, analisando as concepções de A. Melucci, que "a existência de espaços públicos independentes das instituições de governo, do sistema partidário e das estruturas do Estado é condição necessária da democracia contemporânea. Como intermediações entre o nível do poder público e as redes da vida cotidiana, esses espaços públicos requerem simultaneamente os mecanismos de representação e de participação. Ambos são fundamentais para a existência da democracia nas sociedades complexas" (Vieira, Lizt, "Cidadania e Globalização". Rio de Janeiro, Record, 1999, pág. 65).

Além da participação da sociedade civil na gestão das questões referentes à infância e à juventude, o constituinte enfatizou, como já referido, a importância da descentralização administrativa. Com efeito, no que diz respeito ao trabalho infantil, pode-se verificar que as repercussões lastimáveis do fenômeno são percebidas, primordialmente, no âmbito da localidade, pelo que a questão pode ser enfrentada de forma mais genuína, mais adequada, mais realista em nível municipal. "É no Município que o cidadão nasce, vive e constrói sua história. É no Município que ultrapassamos a fria lógica dos números para encontrar cada criança, cada jovem, cada cidadão para restituir-lhes a dignidade de seus direitos" (Amencar/Famurs/ Febem-RS/FMSS, 1966, op. cit., in Pereira, lrandi e outro, "Liberdade Assistida & Prestação de Serviço à comunidade", (IEE/PUC-SP e Febem.SP, 1999, pág. 19).

Arno Vogel, ao tratar da "partilha do poder", justifica a importância de as políticas públicas retornarem ao eixo da localidade, enfatizando ser o município "um campo de força. Cada segmento social, instituição ou ator político tem, dentro dele, o seu peso específico. Graças à sua morfologia e cultura sociopolítica peculiar, a comunidade constitui, pois, um meio capaz de exercer, sobre os empreendimentos de mudança social, um certo efeito de refração" (Vogel, Arno, "Do Estado ao Estatuto - propostas e vicissitudes da política de atendimento à infância e à adolescência no Brasil contemporâneo". ln Pilotti, Francisco e Rizzini, Irene, "A Arte de Governar Crianças". Rio de Janeiro, Universidade Santa Úrsula, 1995, pág. 299).

Os conselhos de direitos e conselhos tutelares, criados dentro desta nova ótica, constituem mecanismos oficiais para a consolidação do poder local (Pereira, lrandi e outro, "Liberdade Assistida & Prestação de Serviço à comunidade", IEE/PUC-SP e Febem-SP, 1999, pág. 19).

Em resposta às diretrizes ditadas, as práticas tradicionais passaram a ser rapidamente substituídas. Neste contexto, surgem no Brasil os Fóruns ou Comissões Estaduais de Erradicação do Trabalho Infantil, a exemplo do que ocorreu em 1994, com a instalação do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil.

Maria do Carmo Brant de Carvalho enfatiza a importância deste espaço de articulação, de caráter "inovador e eficaz", em razão de que: introduz uma parceria permanente entre governo e sociedade civil nas decisões e na própria implementação, implantação e avaliação de ações; introduz a complementaridade de esforços entre as três esferas da sociedade: federal, estadual e municipal; introduz o caráter multisetorial ou transetorial dos programas (trabalho, educação, assistência social e saúde) (Carvalho, Maria do Carmo Brant de, "O Combate ao Trabalho Infantil na Voz e na Agenda da Sociedade e do Estado Brasileiro") (texto mimeo.).

2. A Proposta do fórum estadual de erradicação do trabalho infantil e proteção do adolescente do trabalho de Santa Catarina

O Fórum de Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção do Adolescente no Trabalho em Santa Catarina (Fórum) vem se comprometendo, ao longo dos cinco anos de sua existência, com a luta pelo resgate dos direitos da infância e da adolescência, sob a ótica de que o direito de não trabalhar antes da idade mínima constitui premissa para que o direito à infância seja efetivamente assegurado.

O respeito à idade mínima deve, como inicialmente ressaltado, ser observado em consonância com as disposições do Estatuto da Criança e do Adolescente, que garantem a essa faixa etária a proteção integral. Nestes termos, retirar as crianças do trabalho implica a responsabilidade de oferecer-lhes a oportunidade de acesso à sala de aula e aos programas de atendimento comprometidos com a cidadania.

Com base nos Diagnósticos elaborados pela Delegacia Regional do Trabalho, nos anos de 1996 a 1998, o Fórum vem se deslocando para os diversos Municípios revelados, no referido estudo, como pontos de concentração de mão-de-obra infantil ou de trabalhadores adolescentes em condição irregular. O objetivo é definir os papéis institucionais dos atores envolvidos na problemática em conjunto com as comunidades locais, tornando explícito o papel dos entes governamentais, das ONGS e da própria comunidade na solução dos problemas.

Estabelecidas as parcerias, o diagnóstico vem sendo apontado pelas comunidades como primeira etapa para a realização de ações que visam ao combate do trabalho infantil, porquanto o conhecimento da realidade constitui pressuposto para a formulação de políticas públicas a serem sugeridas aos conselhos de direito.

Os fóruns temáticos, nesse sentido, em vista de sua composição incluir parceiros diretamente envolvidos com a problemática - no caso do Fórum de Erradicação do Trabalho Infantil, os sindicatos, o Ministério Público do Trabalho, a Delegacia do Trabalho, o SINE e outros - constituem, hoje, mecanismo de fortalecimento dos conselhos de direitos, podendo sugerir políticas públicas mais adequadas e específicas sobre o tema.

A participação da sociedade civil e das instituições governamentais nos Fóruns tem o efeito de identificar o papel de cada ator envolvido, inclusive as atribuições das instituições, que passam a se comprometer, no conjunto, com as ações que lhes são afetas. Com efeito, de acordo com Habermas os movimentos sociais apresentam uma orientação bidimensional: defensiva - ao darem um contorno a uma comunidade idealizada ameaçada pela ação do Estado, construindo um "nós" que se constitui em torno de propósitos imediatos e comuns; e ofensiva - ao colocarem em discussão problemas de relevância indiscutível para o conjunto da sociedade. É exatamente a pressão exercida pela sociedade devidamente identificada, no mesmo espaço político, que desencadeia a efetivação das atribuições inerentes às instituições oficiais integrantes do Fórum (in Costa, Sérgio, "Atores da Sociedade Civil e Participação Política: Algumas Restrições", Caderno do CEAS, n. 155, pág. 65).

3. O Ministério Público do Trabalho e a sua integração aos fóruns de erradicação do trabalho infantil

O Ministério Público do Trabalho, como parceiro de Fóruns temáticos, vem promovendo diversas medidas complementares à atuação das demais entidades que compõem referidos espaços de discussão. Além das atribuições tradicionais decorrentes de sua condição de "órgão da sociedade", vem assumindo seu compromisso político-social numa perspectiva mais abrangente, porquanto, o Direito deixou de proteger apenas as autonomias privadas, incorporando "objetivos sociais muito mais amplos", cabendo à Instituição responder por interesses de muito maior relevância e repercussão da sociedade" (Salles, Carlos Alberto, "Entre a Razão e a Utopia: A Formação Histórica do Ministério Público", in Vigliar, José Marcelo Menezes e Macedo Júnior, Ronaldo Porto, "Ministério Público II", São Paulo: Atlas, 1999, pág. 40).

Nesta perspectiva, o Ministério Público, a partir do texto constitucional de 1988, veio a colocar em questão o que o eminente Promotor de Justiça do Estado de São Paulo, Ronaldo Porto Macedo Júnior, refere como "a lógica de um processo legislativo que cria direitos porque esses não serão implementados" (Macedo Jr, Ronaldo Porto, "Ministério Público Brasileiro: Um Novo Ator Político", in Vigliar, José Marcelo Menezes e Macedo Júnior, Ronaldo Porto, "Ministério Público II", São Paulo: Atlas, 1999, pág. 109).

Não só as inúmeras ações civis públicas ajuizadas, como o desempenho do papel de articulador social do Procurador do Trabalho, engajando-se em comissões ao lado da sociedade civil vem propiciando a efetividade de direitos trabalhistas antes só insculpidos na letra da lei.

Identificada a demanda social através de Fóruns representativos, incumbe ao Ministério Público engajar sua atuação no grande pacto social que se firma para o combate de fenômenos sociais complexos, como o trabalho infantil, e que não dependem apenas da atuação de uma entidade para serem enfrentados.

4. As atribuições do Ministério Público do Trabalho no combate ao trabalho infantil

A ação do Ministério Público do Trabalho no combate ao trabalho infantil e na proteção do adolescente trabalhador decorre de imposição legal. Está devidamente alicerçada nos dispositivos do Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como na Lei Orgânica do Ministério Público da União.

O inciso IV do artigo 148 do ECA especifica a competência da Justiça da Infância e da Juventude "para conhecer de ações civis fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos afetos à criança e ao adolescente, observado o disposto no art. 209" (sem grifo no original). Ora, evidentemente, desta norma que define a competência material da Justiça da Infância e da Juventude estão excluídas as ações trabalhistas, porquanto o indigitado dispositivo legal reporta-se às ações civis em sentido estrito. Interpretar de outra forma seria violar o art. 114 da Constituição Federal que define a competência da Justiça do Trabalho para julgar dissídios individuais e coletivos entre empregados e empregadores e, mediante lei, outras controvérsias oriundas da relação de trabalho.

O trabalho prestado por crianças e adolescentes, por ser subordinado a alguém que dele obtém qualquer vantagem, configura a relação de emprego, ainda que inexistente o contrato formal de trabalho. Frise-se que, no âmbito do processo do trabalho, vigora o princípio da primazia da realidade, de acordo com o qual a existência dos elementos fáticos é suficiente para o fim de estabelecer os efeitos do contrato, ainda que não documentado.

Como bem alude José Luciano de Castilho Pereira, "(...) o Direito do Trabalho surge com a pontuação de que é a realidade que marca a vida das relações de trabalho, realidade esta muitas vezes distante das abstratas formulações legais ou, em não raros momentos, mascarada pelo manto fugaz da liberdade contratual. Aqui, pois, fica destacado o princípio da primazia da realidade"(Temas Polêmicos do Direito Material e do Direito Processual, in Revista Síntese Trabalhista n. 62 - ago./94, pág. 7).

Cabe invocar, para bem localizar a temática, o que ensina o doutrinador Américo Plá Rodriguez sobre o princípio supramencionado: "O princípio da primazia da realidade significa que, em caso de discordância entre o que ocorre na prática e o que emerge de documentos ou acordos, deve-se dar preferência ao primeiro, isto é, ao que sucede no terreno dos fatos". Mais adiante, citando Evaristo de Moraes Filho, diz: Pouco importa o nomem juris que lhe seja atribuído em suas relações de emprego. O contrato de trabalho, segundo a conhecida denominação de lnarritu, Ministro da Suprema Corte Mexicana, é um contrato-realidade, preso à realidade cotidiana e concreta. Daí o conceito do art. 442 da CLT, quando dispõe que "Contrato Individual de Trabalho é acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego" ("Princípios de Direto do Trabalho", São Paulo, Ed. LTr, 1996, págs. 217 e 218).

Neste sentido, a Justiça do Trabalho é competente para dirimir todas as lides que tenham por objeto discutir relações de emprego, inclusive aquelas que se encontram forjadas em programas de trabalho educativo ou outros programas sócio-educativos previstos no ECA. Importa apenas identificar a relação de emprego subjacente.

Em suma, para José Cretella Júnior: "a base do legislador para fixar a competência da Justiça do Trabalho é, antes de tudo, a verificação da existência de relação de trabalho entre empregado e empregador. Este é pressuposto ... "Dirimir questões que derivam da relação empregatícia entre empregador e empregado - eis a tarefa precisa que cabe à Justiça do Trabalho"("Comentários à Constituição 1988", São Paulo, Ed. Forense Universitária, 1993, pág. 3207).

É ilustrativa a decisão do Supremo Tribunal Federal, solucionando o Conflito de Jurisdição n. 6.959-6 (DF), cujo acórdão foi da lavra do Ministro Sepúlveda Pertence, onde se lê: "À determinação da competência da Justiça do Trabalho não importa que dependa a solução da lide de questões de direito Civil, mas sim, no caso, que a promessa de contratar, cujo alegado conteúdo é o fundamento do pedido, tenha sido feita em razão da relação de emprego, inserindo-se no contrato de trabalho" (Revista LTr 59-10/1370).

No texto do acórdão, ao ser especificado que os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, da competência da Justiça do Trabalho, são aqueles "decorrentes da relação de trabalho", afirma o redator do aresto, didaticamente: "Para saber se a lide decorre da relação de trabalho não tenho como decisivo, data venia, que a sua composição judicial penda ou não de solução de temas jurídicos de direito comum, e não, especificamente, de Direito do Trabalho. O fundamental é que a relação jurídica alegada como suporte do pedido esteja vinculada, como o efeito à causa, à relação empregatícia, como me parece inquestionável que se passa aqui, não obstante o seu conteúdo específico seja o de uma promessa de venda, instituto de Direito Civil".

O artigo 209 do ECA também corrobora a afirmação de que as lides de natureza trabalhista, como a que visa retirar do trabalho a criança ou o adolescente que não tenham alcançado a idade mínima legal, são da competência da Justiça do Trabalho.

Assim dispõe o referido dispositivo legal:

"Art. 209. As ações previstas neste Capítulo serão propostas no foro do local onde ocorreu ou deva ocorrer a ação ou omissão, cujo juízo terá competência absoluta para processar a causa, ressalvadas a competência da Justiça Federal e a competência originária dos Tribunais Superiores" (sem grifo no original).

Trata-se, à evidência, de norma que define a competência territorial. Não obstante, o mesmo dispositivo legal ressalva a competência da Justiça Federal, o que autoriza sejam os direitos da infância e da juventude decorrentes de relações de trabalho objeto de ações propostas perante a Justiça do Trabalho. Neste sentido, convém ressaltar que a Justiça do Trabalho constitui um ramo da Justiça Federal lato sensu. Esta, inclusive, é a lição do mestre Celso Ribeiro Bastos ("Curso de Direito Constitucional", São Paulo, Ed. Saraiva, 1998, págs. 378/380, a qual transcrevemos:

"A estrutura da justiça brasileira deve ser estudada levando-se em conta dois aspectos: de um lado, em decorrência da forma federal de Estado,a Justiça se divide em federal e estadual; de outro, em razão da competência outorgada pela Constituição, temos a justiça comum e especializada. Tanto a Justiça federal quanto a estadual se bipartem em comum e especializada. A esta incumbe a prestação jurisdicional relativa às matérias: militar, eleitoral e trabalhista. A justiça comum é toda aquela que remanesce da justiça especializada. Não sendo especializada, é comum.

(omissis)

Justiça federal comum - é exercida em primeiro grau de jurisdição pelos juízes federais. Cada Estado, assim como o Distrito Federal, constituirá uma seção judiciária federal que terá por sede a respectiva Capital (CF art. 110). A competência da justiça federal comum deve ser discriminada no art, 109 da Constituição Federal. Em segundo grau de jurisdição, a justiça federal comum é exercida pelos Tribunais Regionais Federais, cuja composição e competência estão previstas nos arts. 107 e 108 da Constituição Federal.

- Justiça federal especializada:

- Justiça Militar : (omissis)

- Justiça Eleitoral: (omissis)

- Justiça do Trabalho: (omissis)

Outro não é o escólio de Michel Temer, de acordo com o qual, "como decorrência da forma federal de Estado, a Justiça se biparte em federal e estadual" (Elementos de direito constitucional ". São Paulo, Malheiros Editora, 1998, pág. 173 ).

Respeitando, portanto, as competências das Justiças, definidas pela Constituição Federal, o legislador, no art. 209 do ECA, com acerto ressalvou a competência da Justiça Federal, incluindo, portanto, todos os seus ramos especializados. Com efeito, onde a lei não distingue, não cabe ao intérprete fazê-lo.

Em seguida, no art. 210 do ECA, o Ministério Público é arrolado dentre os entes que possuem legitimação concorrente para propor ações em defesa de interesses difusos e coletivos. O parágrafo 1° do mesmo dispositivo legal admite o litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da União e o Ministério Público do Estado. Mais uma vez, não cabe restringir o alcance da lei, o que impõe admitir que também o Ministério Público do Trabalho, ramo do Ministério Público da União (artigo 128, inciso 1, alínea b) está legitimado.

Inclusive, o art. 200 do ECA prevê que as funções do Ministério Público, previstas na lei, serão exercidas nos termos da respectiva Lei Orgânica. Assim, para que sejam protegidos interesses não arrolados entre os incisos do art. 208, mas admitidos em seu parágrafo único, como a retirada de crianças e jovens do trabalho, deve o Ministério Público do Trabalho atuar na forma como impõe a Lei Complementar n. 75, de 20 de maio de 1993, a Lei Orgânica do Ministério Público da União:

"Art. 83. Compete ao Ministério Público do Trabalho o exercício das seguintes atribuições junto aos órgãos da Justiça do Trabalho:

(omissis)

V - propor as ações necessárias à defesa dos direitos e interesses dos menores, incapazes e índios, decorrentes da relação de trabalho".

"Art. 84. Incumbe ao Ministério Público do Trabalho, no âmbito de suas atribuições, exercer as funções institucionais previstas nos Capítulos I, II, III e IV do Título I, especialmente:

(omissis)

II - Instaurar inquérito civil público e outros procedimentos administrativos, sempre que cabíveis, para assegurar os direitos sociais dos trabalhadores ".

lves Gandra da Silva Martins Filho, atualmente Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, tece o seguinte comentário acerca da autuação do Parquet no que se refere à defesa de direitos de crianças e adolescentes:

"A atuação do Ministério Público do Trabalho na proteção do menor tem como pauta a apuração das denúncias de utilização de menores de 14 anos em empresas ou fazendas, o desvirtuamento da aprendizagem em mera atividade produtiva, e o descumprimento das normas legais sobre o trabalho do menor de 18 anos (CLT arts. 404-433), exigindo-se a cessação da conduta ilegal da empresa, o pagamento dos direitos do menor que trabalhou e a imposição de multas e indenizações previstas na Consolidação e nas Leis ns. 7.347/85 e 8.069/90.

Os instrumentos de que dispõe o Ministério Público do Trabalho para coibir a exploração do trabalho do menor são aqueles ofertados pela Lei complementar n. 75/93 - Lei Orgânica do Ministério Público da União -, que previu expressamente a competência do mesmo para promover a ação civil pública (art. 83, III) e instaurar o inquérito civil público (art. 84, II)". (A Questão do Trabalho do Menor, Revista do Ministério Público do Trabalho n. 10, ano V, Setembro/95, São Paulo, Ed. LTr.pág. 86).

A atuação do Ministério Público do Trabalho no combate ao trabalho infantil vem sendo, há longo tempo, reconhecida pelos diversos segmentos oficiais e da sociedade. Já no mês de novembro de 1994, como ainda lembra o Ministro lves Gandra da Silva Martins Filho, foi firmado convênio entre o Ministério Público do Trabalho, o Ministério Público Federal, o Ministério do Trabalho e a Polícia Federal, "para ação conjunta na proteção do trabalhador, especialmente quanto à erradicação do trabalho forçado e da exploração do trabalho infantil" (op. cit., pág. 90).

No Relatório Final da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, criada mediante o Requerimento n. 001/1996-CN, com a finalidade de apurar as denúncias contidas na reportagem da Revista Veja, do dia 30 de agosto de 1995, sobre o trabalho de crianças e adolescentes no Brasil, é ressaltada a atuação do Ministério Público do Trabalho de São Paulo com relação às iniciativas de governos municipais rotuladas como "programas de trabalho educativo". Do Diário do Congresso Nacional de 30.6.99, destaca-se o texto do relatório, que transcrevemos:

"23. (Programas governamentais e não governamentais de inserção de menores no trabalho) O Ministério do Trabalho, através das ações coordenadas regionalmente pelos Núcleos de Combate ao Trabalho Infantil e Proteção ao Trabalhador Adolescente, tem agido no estreito cumprimento dos dispositivos legais que regem a matéria. Os programas devem garantir os direitos trabalhistas e previdenciários, presença na escola e demais condições de trabalho garantidas pela Consolidação das Leis do Trabalho e Estatuto da Criança e do Adolescente notadamente seu artigo 68. Nesse sentido não se diferenciam os programas governamentais dos não governamentais. Todos devem cumprir os requisitos legais. A orientação dos núcleos é que constatada qualquer irregularidade no desenvolvimento dos programas, deve-se iniciar gestões junto aos seus patrocinadores e às autoridades responsáveis no sentido de superá-las, trazendo-os para o campo da legalidade. Não sendo possível, a fiscalização deverá tomar as medidas punitivas de que é legalmente responsável, assim como a imediata comunicação às demais autoridades competentes. As ações legais devem ser tomadas sempre que no limite do processo de negociação não se vislumbrar a mínima possibilidade de legalização dos programas. A avaliação da legalidade dos programas deve contar sempre com a participação de representantes do Ministério Público do Trabalho. Nesse sentido, cabe mencionar o caso dos Guardas Mirins de São Paulo onde foram registrados, apenas nos últimos seis meses, nas entidades ou nas empresas, cerca de 10.000 adolescentes com contratos baseados no art. 68 do ECA, com acompanhamento obrigatório de educadores e reforço escolar nos Municípios de Santos, Guarujá, Campinas, Marília, Araçatuba e outros. A regularização das Guardas Mirins é uma ação conjunta da Delegacia Regional do Trabalho de São Paulo e da Procuradoria do Trabalho da 15ª Região. Outras ações conjuntas estão sendo desenvolvidas nos Estados do Mato Grosso do Sul, Paraná, Pernambuco e Minas Gerais, além de ações de fiscalização em todos os Estados" (sem grifo no original).

Visando a atuação em largo espectro, o Ministério Público do Trabalho em Santa Catarina vem promovendo a assinatura de termos de compromisso por parte de entes sindicais representantes da categoria econômica, os quais, expressamente autorizados por assembléia de seus associados, assumem, em nome das empresas que representam, a não contratação de trabalhadores com menos de 16 anos, salvo na condição de aprendiz, e a não exposição de menores de 18 anos a condições insalubres, penosas e perigosas, sob pena de pagamento de multa vultosa (entre 5.000 e 15.000 UFIR's, dependendo da categoria), revertida em favor do Fundo da Infância e da Adolescência (FIA) local, sob a fiscalização da Delegacia Regional do Trabalho e também dos Conselhos Tutelares. Tal ação vem sendo edificada especialmente com relação aos sindicatos cuja base territorial abrange os Municípios beneficiados pelo Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), da Secretaria de Assistência Social do Ministério da Previdência e Assistência Social, como ação complementar às de diversas entidades que compõem o Fórum Estadual.

5. Conclusão

O efetivo compromisso dos Membros do Ministério Público do Trabalho no sentido de dar cumprimento às relevantes atribuições que lhes são afetas na área da infância tem obtido o respaldo de todos os setores da sociedade e também das entidades oficiais, que

vêm reconhecendo o edificante trabalho realizado por esta Instituição em todo o País. Trata-se de ação de largo alcance e, repita-se, de caráter complementar, porquanto a cidadania da criança só poderá ser resgatada integralmente na medida em que outras entidades se incumbam de propiciar-lhe a escola e a jornada complementar, bem como propiciem o fortalecimento das famílias, no que diz respeito à geração de renda e à qualificação profissional

Desta forma, o Ministério Público do Trabalho está, como nas palavras do Mestre e Promotor de Justiça Carlos Alberto de Salles, apreendendo "a realidade em perspectiva, tendo por base não apenas como ela é, mas, dentro de certo horizonte de sentido, como ela deveria ser" (... ) encontrando "um justo termo entre a razão e a utopia, conciliando um modo de produzir e aplicar um direito ainda não inteiramente superado e a necessidade de dar respostas a funções jurídicas e sociais inteiramente inovadoras" (Salles, Carlos Alberto, "Entre a Razão e a Utopia: A Formação Histórica do Ministério Público", in Vigliar José Marcelo Menezes e Macedo Júnior, Ronaldo Porto, "Ministério Público II", São Paulo: Atlas, 1999, pág. 41).

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