terça-feira, 2 de março de 2010

Pressão política e discriminação cultural emperra lei de ampliação de direitos às domésticas (Luiz Salvador)

(*) Luiz Salvador

O Jornal Folha de São Paulo, edição de 24 de janeiro de 2010, traz reportagem sobre o emperramento da proposta de Emenda Constitucional que iguala direitos do doméstico aos demais trabalhadores.

A própria CF de 88, criou verdadeira discriminação social ao não igualar os direitos do trabalhador doméstico aos trabalhadores urbanos, mantendo-se o interesse patrimonialístico do modelo neoliberal da maior produtividade, lucratividade ao menor custo operacional possível.

Prevalece na estrutura social a prevalência do interesse por manter baixos os salários da empregada doméstica, para que a dona de casa, no geral melhor capacitada a se sujeitar a trabalhar fora, também, com salários baixos e flexibilizados, pois que sabido que acaso se igualem os direitos do empregado doméstico com os do trabalhador urbano, os custos da mão de obra dos admitidos no trabalho externo (trabalhadores urbanos) também terão que ser aumentados, porque uma dona de casa passará a não mais ter condições de aceitar emprego fora, para pagar sua empregada doméstica. Dessa forma, não se aprovando a lei que iguala o salário da doméstica ao do trabalhador urbano, mantém-se a pirâmide social vigente em que os trabalhadores da base da pirâmide possam sustentar os altos ganhos de quem se situa mais no “alto da pirâmide”.

Contradição.
Nossa Carta Cidadã proíbe qualquer tipo de discriminação, ainda que salarial. No entanto, o Parágrafo único do próprio artigo 7º de nossa Constituição Cidadã, ao mesmo tempo em que elencou, 34 direitos fundamentais laborais ao trabalhador urbano, aos domésticos elencou apenas 9, criando verdadeira discriminação social contra esses trabalhadores, mantendo-se esses trabalhadores numa categoria de “menos iguais”. É o que deixa claro o disposto no parágrafo único do artigo sétimo da CF, 88: “São assegurados à categoria dos trabalhadores domésticos os direitos previstos nos incisos IV, VI, VIII, XV, XVII, XVIII, XIX, XXI e XXIV, bem como a sua integração à previdência social”.

Aos trabalhadores urbanos se aplicam os direitos consolidados na CLT, mas aos trabalhadores domésticos se aplicam a legislação restritiva de número Nº 5.859, DE 11 DE DEZEMBRO DE 1972, que não assegura, direitos, a horas extras, adicional noturno, piso salarial, sendo que somente recentemente houve algum avanço, passando-se a ter direito a férias de 30 dias e à estabilidade da gestante. O FGTS, somente se o empregador quiser, mas se conceder, não pode mais retroceder, incorporando-se ao patrimônio juríco do trabalhador.

link:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5859.htm

Leia a reportagem sobre o assunto publicado na Folha de São Paulo


FOLHA DE SÃO PAULO, São Paulo, domingo, 24 de janeiro de 2010, DINHEIROLei que dá direitos às domésticas emperra

Pressão política e falta de conclusão de estudos interrompem elaboração de PEC que beneficiaria 6,8 milhões de trabalhadores

Para especialistas, aumento dos custos de contratação e encargos poderiam ter o efeito colateral de elevar a informalidade no setor

FÁTIMA FERNANDES
DA REPORTAGEM LOCAL

Pressão política e falta de conclusão de estudos interromperam a elaboração de uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional) do governo federal para igualar os direitos dos empregados domésticos aos das demais categorias.

Cinco ministérios -Trabalho, Previdência Social, Casa Civil, Fazenda e Planejamento- chegaram a discutir em 2008 mudanças na legislação da maior categoria profissional do Brasil, formada por 6,8 milhões de trabalhadores. A intenção era encaminhar uma PEC ao Congresso até o final de 2008, o que não aconteceu.

O empregado doméstico, como estabelece a Constituição Federal de 1988, não tem direito a jornada de trabalho estabelecida em lei, hora extra, adicional noturno, salário-família, FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) obrigatório, seguro-desemprego e benefício por acidente de trabalho.

Em 2008, a ministra Nilcéa Freire, da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM), subordinada à Presidência, disse que, com a PEC, "o governo queria apagar a mancha de discriminação que estava presente na Constituição" em relação à categoria.

"Não se conseguiu fechar os estudos, que são complexos. E a elaboração da PEC não depende apenas da secretaria. Não é fácil, pois há implicação financeira, custos", afirma Eunice Léa de Moraes, gerente de projetos da subsecretaria de Articulação Institucional da SPM.

A SPM solicitou aos ministérios envolvidos na elaboração da PEC a formação de um novo grupo de estudos, mais enxuto, para reiniciar a discussão. "A ideia é extinguir o parágrafo único do artigo 7º da Constituição Federal", diz Moraes.

Esse parágrafo limita os direitos das domésticas. A Constituição estabelece 34 direitos para os trabalhadores em geral e nove para os domésticos.

"As discussões sobre a legislação para as domésticas não avançaram. É preciso entender que os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário são feitos por patrões. Não podemos nos iludir e achar que vai ser fácil aprovar mudança na legislação das domésticas. Isso não depende só do presidente Lula. Depende de ministros, senadores, deputados e sociedade civil", afirma Creuza Maria Oliveira, presidente da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas, com 35 sindicatos filiados e ligada à CUT (Central Única dos Trabalhadores).

O governo voltou atrás nas discussões para ampliar os direitos das domésticas porque ficou em dúvida se era o caso de agradar à maior categoria profissional do país e desagradar à classe média, que é quem paga as domésticas, na avaliação do advogado Luis Carlos Moro.

"O governo foi hesitante em relação à matéria e não conseguiu conciliar as diferenças internas. Quem vai se habilitar a ser pai das domésticas e padrasto da classe média? Nenhum político quer assumir esse ônus, especialmente neste ano de eleição", diz Moro.

Cerca de 73% dos trabalhadores domésticos (4,89 milhões de pessoas) trabalham na informalidade -não têm carteira assinada. "É justo o trabalhador doméstico ter os mesmos direitos de outros empregados. Só que haverá elevação de custo para os empregadores, o que poderá resultar em elevação da informalidade", diz o consultor Mario Avelino, fundador do site Doméstica Legal.

Tiro no pé
Se os direitos dos trabalhadores forem estendidos às domésticas, quem paga um salário mínimo de R$ 510 por mês, por exemplo, teria de desembolsar mensalmente mais 8% de FGTS (R$ 40,8), sem contar horas extras, se a jornada de 44 horas semanais for excedida, além de férias e 13º.

O empregador teria ainda de pagar mais R$ 61,20 de contribuição ao INSS, que hoje é de 12%, e 40% de multa sobre o total do saldo depositado no FGTS, se a empregada for demitida sem justa causa. "A equiparação de direitos pode significar um tiro no pé do emprego doméstico."

Para Avelino, o governo deveria ter iniciativas para reduzir os encargos, como diminuir as alíquotas para contribuição previdenciária do empregador e da empregada e possibilidade de descontar gastos com doméstica do Imposto de Renda. Projetos que defendem essas políticas já estão no Congresso.

Para Luiz Salvador, presidente da Abrat (Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas), a sociedade não quer mudanças na lei das domésticas.

Paulo Pereira da Silva, presidente da Força Sindical, diz que parte do Congresso não quer "arrumar encrenca com a classe média". "O ideal seria a união de 10 ou 12 deputados para fazer um projeto de lei. Nesse caso, entendo que Lula não vetaria o projeto."

Link: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi2401201006.htm

Frases
"É preciso entender que os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário são feitos por patrões. Não podemos nos iludir e achar que vai ser fácil aprovar mudança na legislação das domésticas" CREUZA MARIA OLIVEIRA, Presidente da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas


"Quem vai se habilitar a ser pai das domésticas e padrasto da classe média? Nenhum político quer assumir esse ônus" LUIS CARLOS MORO - advogado

Convenção da OIT abordará tema pela 1ª vez
DA REPORTAGEM LOCAL

A possibilidade de a OIT (Organização Internacional do Trabalho) ter uma convenção internacional ainda neste ano para trabalhadores domésticos deverá forçar o Brasil a avançar nas discussões sobre a categoria.
A avaliação é de Creuza Maria Oliveira, presidente da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas, ligada à CUT. Neste ano, segundo ela, pela primeira vez a OIT organizará, em julho, em Genebra, uma convenção de direitos das domésticas.
"Se for feita a convenção internacional, como esperamos, o Brasil será forçado a caminhar mais rapidamente para ampliar direitos para a categoria dos trabalhadores domésticos, que faz parte da classe operária brasileira", diz.
A presidente da federação diz que as domésticas ficaram desapontadas com a falta de avanço nas discussões e nos estudos para elaboração de uma PEC pelo governo federal.
"Mas já obtivemos algumas conquistas, como a do direito à estabilidade à gestante e férias de 30 dias. As patroas também não podem mais descontar o que dão para as empregadas. Mas a categoria precisa de mais. Vamos lutar para que as domésticas se mobilizem cada vez mais. Agora, acredito que será muito difícil, neste ano de eleição, o governo encaminhar PEC para melhorar a situação das domésticas. Vamos contar com a convenção da OIT."

Link: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi2401201008.htm

(*) Luiz Salvador é Presidente da ABRAT (www.abrat.adv.br), Presidente da ALAL (www.alal.la), Representante Brasileiro no Depto. de Saúde do Trabalhador da JUTRA (www.jutra.org), assessor jurídico da AEPETRO e da ATIVA, membro integrante do corpo técnico do Diap e Secretário Geral da CNDS do Conselho Federal da OAB, e-mail: luizsalv@terra.com.br, site: www.defesadotrabalhador.com.br

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