DA MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ
A respeitável sentença condenada a recorrente ao pagamento de multa arbitrada em 1% (um por cento) sobre o valor dado à causa na prefacial, na medida em que entende que a argüição de preliminar de extinção do feito por não submissão do feito à comissão de conciliação prévia, sem formulação de proposta conciliatória é “atitude temerária” o que não pode prosperar.
Ainda, não há que se falar em atitude desleal da recorrente, visando apenas procrastinar o processo a argüição da preliminar de extinção do feito por não submissão à comissão de conciliação prévia.
Note-se que, tal entendimento é descabido, tendo em vista que a reclamada nem de soslaio pode ser considerada litigante de má-fé, muito menos praticante de ato temerário ao exercer o seu direito de defesa, garantido expressamente no artigo 5º LV da Constituição Federal.
A preliminar de ausência de submissão da demanda à comissão de conciliação prévia, com pedido de extinção do feito sem resolução de mérito, trata de tese defensiva da recorrente, com fundamento no artigo 625-D da Norma Consolidada, não podendo ser caracterizada como medida procrastinatória e sim exercício regular do direito de defesa da recorrente.
Ademais, consta equivocadamente na respeitável sentença parágrafo no tópico da litigância de má-fé, menção a “excessivos embargos declaratórios”, o que não é o caso dos autos, eis que a sentença ora atacada é a primeira proferida no processo sendo descabida tal argumentação.
Assim, plenamente cabível a preliminar de extinção do feito sem resolução de mérito argüida pela recorrente em contestação, sendo incabível a multa aplicada pelo MM Juízo, conforme entendimento do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região:
EMENTA: LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. INOCORRÊNCIA – EXCLUSÃO DA MULTA APLICADA: "Evidenciado que a empregadora exerceu legítimo direito de defesa, ao argüir a exigência de o pedido ser submetido à Comissão de Conciliação Prévia, não se pode enquadrá-la como litigante de má-fé". Recurso ordinário a que se dá provimento parcial. I. RELATÓRIO: Irresignada com a r. sentença de fls. 92/96, cujo relatório adoto, e que julgou PROCEDENTE EM PARTE a reclamatória, dela recorre a reclamada a fls. 102/106. Há embargos de declaração, apresentados pela demandada (fls. 98/99); acolhidos (fl. 108). Assevera que a multa que lhe foi aplicada, por litigância de má-fé, não pode prevalecer. Aduz que utilizou tese jurídica que lhe favorecia, não podendo ser apenada por adotar entendimento diverso do n. Julgador. Pondera que, tendo em vista a redação do art. 625-D, da lei consolidada, é cabível a arguição de preliminar de extinção do feito, sem julgamento do mérito, quando não submetida a demanda à análise da comissão de conciliação prévia. Acrescenta que não caracteriza conduta procrastinatória o fato de ter afirmado que não formularia proposta de acordo na comissão de conciliação prévia ou em Juízo. Entendendo de igual forma essa C. Corte, requer seja a incidência da multa reduzida ao valor da condenação (R$ 15000,00), posto que o recorrido formulou pedidos acobertados pela prescrição qüinqüenal. II. FUNDAMENTOS: DO CONHECIMENTO: Preliminar de deserção: REJEITO. Aduz o recorrido que o apelo deve ser considerado deserto, vez que não recolhida a multa por litigância de má-fé. Sem razão o recorrido. Em primeiro lugar, há que se destacar que a legalidade da cominação da multa aplicada à empresa é objeto de insurgência recursal. Outrossim, o art. 35, do CPC, cuida apenas de estabelecer a forma de apuração das sanções processuais, não guindando a multa fixada, por litigância de má-fé, à condição de pressuposto objetivo de admissibilidade de recurso. A condenação imposta ao empregador será apurada a final, em regular processo de execução, não havendo que se falar em deserção do apelo. CONHEÇO do Recurso Ordinário, posto que obedecidas as formalidades legais. No mérito, DOU PROVIMENTO PARCIAL. Da multa, por litigância de má-fé: Inconforma-se a recorrente com a multa que lhe foi imposta, aduzindo que o fato de adotar posicionamento diverso do n. Juízo não é suficiente a permitir a aplicação de penalidade por litigância de má-fé. Destaca que a redação dada ao art. 625-D, da lei consolidada, possibilita a arguição de preliminar de extinção do feito, sem análise do mérito. O n. Juízo sentenciante entendeu que há intuito protelatório na preliminar de extinção do feito, arguída pela empresa, já que, em audiência, não formulou proposta conciliatória e declarou que não faria qualquer acordo perante a comissão de conciliação prévia. O legislador, com as comissões de conciliação prévia, criadas pela Lei n.º 9958/2000, objetiva o diálogo entre empregado e empregador antes do ajuizamento da demanda trabalhista, evitando transferir a solução dos conflitos individuais do trabalho a decisão judicial. Embora possa parecer contraditório o posicionamento adotado pela recorrente, é inquestionável que há discussão, na doutrina e na jurisprudência, quanto a obrigatoriedade da tentativa de conciliação do conflito individual de trabalho perante as comissões de conciliação prévia, entendendo alguns que a ausência de provocação da comissão implicaria na extinção do feito, sem julgamento do mérito. Todavia, ressalto que esta última posição é minoritária. Este Regional possui Súmula, sob n.º 2, nos seguintes termos: Comissão de Conciliação Prévia. Extinção do processo. (RA n.º 08/2002 – DJE 12/11/02, 19/11/2002, 10/12/2002 e 13/12/2002): "O comparecimento perante a Comissão de Conciliação Prévia é uma faculdade assegurada ao obreiro, objetivando a obtenção de um título executivo extrajudicial, conforme previsto pelo artigo 625-E, parágrafo único, da CLT, mas não constitui condição da ação, nem tampouco pressuposto processual na reclamatória trabalhista, diante do comando emergente do art. 5º, XXXV, da Constituição Federal". Assim, não há que se falar em litigância de má-fé, tendo a recorrente feito uso do direito de defesa que estava ao seu alcance, impondo a exclusão da multa que lhe foi aplicada. Portanto, excluo da condenação a multa aplicada. (...) III. DO EXPOSTO: conheço do Recurso Ordinário. No mérito, dou provimento parcial ao apelo para, observados os fundamentos do voto, excluir da condenação: a) a multa, por litigância de má-fé; b) os domingos laborados nos meses de outubro a dezembro de cada ano. Para os devidos fins, redimensiono o valor da causa para R$ 12000,00. DORA VAZ TREVIÑO. Juíza Relatora. ACÓRDÃO Nº: 20070449818 PROCESSO Nº: 02052-2005-004-02-00-8 ANO: 2006 TURMA: 11ª DATA DE PUBLICAÇÃO: 19/06/2007 – TRT 02.
TRT15ª
PROCESSO TRT 15ª REGIÃO N.º 01543-2006-004-15-00-1
RECURSO ORDINÁRIO
1º RECORRENTE: HOSPITAL SÃO FRANCISCO SOCIEDADE LTDA.
2º RECORRENTE: RONALDO FERREIRA DAS NEVES
ORIGEM: 1ª VARA DO TRABALHO DE RIBEIRÃO PRETO
JUIZ SENTENCIANTE: RICARDO LUÍS VALENTINI
Da r. sentença de fls. 419/423, que julgou procedentes em parte os
pedidos formulados, recorrem as partes, pelas razões de fls. 432/437 e 442/447.
O reclamado postula a reforma da decisão de origem para que seja
afastada a condenação ao pagamento de multa por litigância de má-fé e
indenização pela supressão do intervalo intrajornada.
O reclamante requer a condenação do réu ao pagamento de
diferenças de adicional de insalubridade, pela adoção de sua remuneração como
base de cálculo.
Recolhimento de custas e depósito recursal comprovado às fls.
438/440.
Contra-razões apresentadas pelo reclamado às fls. 450/457.
É o relatório.
VOTO
Conhece-se dos Recursos Ordinários posto que regularmente
processados.
Processo n.º 01543-2006-004-15-00-1 – Fl. 2
RECURSO DO RECLAMADO
DA LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ
A Lei Adjetiva Civil, reputa litigante de má-fé, aquele que, dentre
outros procedimentos condenáveis, altera a verdade dos fatos, usa do
processo para conseguir objetivo ilegal, opõe resistência injustificada ao
andamento do processo, procede de modo temerário em qualquer incidente
ou ato do processo ou provoca incidente manifestamente infundado (CPC,
art.17), esclarecendo-se que diante da omissão da CLT a respeito da matéria, tal
dispositivo legal é aplicável subsidiariamente ao Processo do Trabalho, por força
do disposto no art.769 consolidado.
No entanto, no caso concreto, o fato de o reclamado ter alegado
preliminar de carência de ação por ausência de submissão do feito à Comissão de
Conciliação Prévia, sem formular qualquer proposta de acordo na audiência, não
caracteriza, por si só, a litigância de má-fé.
Desta forma, deve ser afastada a condenação ao pagamento de
multa por litigância de má-fé.
DO INTERVALO INTRAJORNADA
SUPRESSÃO PARCIAL
Postula a primeira recorrente a reforma do julgado quanto ao
deferimento do intervalo intrajornada, sob o fundamento que sempre foi concedido
o intervalo de quinze minutos, conforme constante nos cartões de ponto. Caso
mantida a condenação, postula pela restrição ao pagamento dos minutos
efetivamente suprimidos.
Processo n.º 01543-2006-004-15-00-1 – Fl. 3
O reclamante alega, em inicial, que laborava 6 horas diárias, mas
não usufruía do intervalo de 15 minutos em 4 dias da semana. Ao contestar o
feito, o reclamado afirma que referido intervalo era gozado pelo obreiro,
colacionando aos autos controles de jornada que comprovariam suas alegações.
Com efeito, em audiência, o reclamante reconheceu, expressamente,
a veracidade dos horários anotados nos controles de jornada, inclusive no que
tange aos intervalos para refeição.
No entanto, como bem consignado em origem, da análise dos
cartões de fls. 125 e seguintes, verifica-se que o obreiro não usufruía de 15
minutos de intervalo todos os dias, razão pela qual a r. sentença condenou o
reclamado ao pagamento de indenização pelo intervalo não gozado.
Entretanto, em que pese o devido respeito à r. decisão recorrida,
entendemos ser-lhe necessário pequeno reparo no particular. Isso porque não nos
parece correta a condenação da parte recorrente ao pagamento de 15 minutos
diários, uma vez que restou reconhecida a supressão
parcial
do descanso
intervalar.
Entendemos que a melhor interpretação que se faz do disposto no §
4º do artigo 71 da CLT é a de que este determina a remuneração do tempo
suprimido e não da totalidade do período mínimo de sua duração. Em
conseqüência, merece parcial acolhida a irresignação patronal para restringir a
condenação ao pagamento dos minutos efetivamente suprimidos do intervalo
intrajornada, a serem apurados em regular liquidação de sentença, conforme
anotação nos controles de jornada carreados aos autos.
RECURSO DA PARTE RECLAMANTE
ADICIONAL DE INSALUBRIDADE - BASE DE CÁLCULO
Processo n.º 01543-2006-004-15-00-1 – Fl. 4
Irresigna-se a parte reclamante contra a r. decisão de origem que
determinou o cálculo do adicional de insalubridade sobre o salário mínimo. Aduz
que esse cálculo deve ter por base a remuneração do empregado.
No entender deste Relator, essa matéria não admite mais
controvérsias, tendo em vista a edição da Súmula Vinculante nº 4 pelo Supremo
Tribunal Federal. Na interpretação deste Magistrado acerca desse
pronunciamento da Suprema Corte, restou decidido que embora seja
inconstitucional a utilização do salário mínimo como base de cálculo do adicional
de insalubridade, não pode o julgador adotar outro referencial, posto que compete
ao legislador editar norma que regulamente a matéria. Outrossim, como a
declaração de inconstitucionalidade limita-se à base de cálculo, a parcela deve
continuar a ser paga, mantendo-se, entretanto, a base de cálculo prevista no
artigo 192 da CLT, até que o Poder competente edite norma destinada à eleição
de outra.
Tal entendimento encontra respaldo inclusive em fundamentação de
recente decisão do Presidente do Supremo Tribunal Federal, proferida em sede de
Reclamação ajuizada pena CNI contra a recente alteração patrocinada pelo
Tribunal Superior do Trabalho na redação de sua Súmula de nº 228, que
passamos a transcrever:
“MED. CAUT. EM RECLAMAÇÃO 6.266-0 DISTRITO
FEDERAL
RECLAMANTE(S) : CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA
INDÚSTRIA - CNI
ADVOGADO(A/S) : ELISABETH HOMSI E OUTRO(A/S)
RECLAMADO(A/S) : TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO
(SÚMULA Nº 228)
Processo n.º 01543-2006-004-15-00-1 – Fl. 5
DECISÃO: Trata-se de reclamação, com pedido de
liminar, ajuizada pela Confederação Nacional da
Indústria - CNI, em face da decisão proferida
pelo Plenário do Tribunal Superior do Trabalho
(TST) que editou a Resolução n° 148/2008 e deu
nova redação ao verbete n° 228 da Súmula daquele
Tribunal (Súmula n° 228/TST), nos seguintes
termos:
“ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. BASE DE CÁLCULO. A
partir de 9 de
maio de 2008, data da publicação da Súmula
Vinculante nº 4 do Supremo Tribunal Federal, o
adicional de insalubridade será calculado sobre o
salário básico, salvo critério mais vantajoso
fixado em instrumento coletivo.”
Em síntese, a título de plausibilidade jurídica
do pedido (fumus boni iuris), a reclamante
sustenta que a nova redação da Súmula n° 228/TST
conflita com a Súmula Vinculante n° 4 desta
Corte, ao fixar o salário básico como base de
cálculo do adicional de insalubridade.
No que tange à urgência da pretensão cautelar
(periculum in mora), a reclamante alerta para a
“gravíssima insegurança jurídica”, além de
“reflexos danosos e irreparáveis para os
empregadores representados pela CNI” e “a
proliferação incontinenti de ações, já passíveis
Processo n.º 01543-2006-004-15-00-1 – Fl. 6
de ajuizamento desde a publicação da Resolução do
Tribunal Superior do Trabalho n° 148/2008, que dá
nova redação à Súmula n° 228” (fl. 08).
Passo a decidir.
O art. 7º da Lei n° 11.417, de 19 de dezembro de
2006, dispõe que “da decisão judicial ou do ato
administrativo que contrariar enunciado de súmula
vinculante, negar-lhe vigência ou aplicá-lo
indevidamente caberá reclamação ao Supremo
Tribunal Federal, sem prejuízo dos recursos ou
outros meios admissíveis de impugnação”.
À primeira vista, a pretensão do reclamante
afigura-se plausível no sentido de que a decisão
reclamada teria afrontado a Súmula Vinculante n°
4 desta Corte:
“Salvo nos casos previstos na Constituição, o
salário mínimo não pode ser usado como indexador
de base de cálculo de vantagem de servidor
público ou de empregado, nem ser substituído por
decisão judicial.”
Com efeito, no julgamento que deu origem à
mencionada Súmula Vinculante n° 4 (RE 565.714/SP,
Rel. Min. Cármen Lúcia, Sessão de 30.4.2008 -
Informativo nº 510/STF), esta Corte entendeu que
o adicional de insalubridade deve continuar sendo
calculado com base no salário mínimo, enquanto
não superada a inconstitucionalidade por meio de
lei ou convenção coletiva.
Processo n.º 01543-2006-004-15-00-1 – Fl. 7
Dessa forma, com base no que ficou decidido no RE
565.714/SP e fixado na Súmula Vinculante n° 4,
este Tribunal entendeu que não é possível a
substituição do salário mínimo, seja como base de
cálculo, seja como indexador, antes da edição de
lei ou celebração de convenção coletiva que
regule o adicional de insalubridade.
Logo, à primeira vista, a nova redação
estabelecida para a Súmula n° 228/TST revela
aplicação indevida da Súmula Vinculante n° 4,
porquanto permite a substituição do salário
mínimo pelo salário básico no cálculo do
adicional de insalubridade sem base normativa.
Ante o exposto, defiro a medida liminar para
suspender a aplicação da Súmula n° 228/TST na
parte em que permite a utilização do salário
básico para calcular o adicional de
insalubridade.
Comunique-se, com urgência, e, no mesmo ofício,
solicitem-se informações.
Após, abra-se vista dos autos à Procuradoria-
Geral da República (RI/STF, art. 160).
Publique-se.
Brasília, 15 de julho de 2008.
Ministro GILMAR MENDES
Presidente (art. 13, VIII, RI/STF)” (destacamos)
Processo n.º 01543-2006-004-15-00-1 – Fl. 8
Todavia, não obstante o entendimento deste Relator na forma
exposta acima, os demais integrantes da Câmara continuam entendendo que a
parcela em questão deve ser calculada sobre o salário base do empregado, por
julgar que em razão da declaração da inconstitucionalidade da adoção do salário
mínimo como base de cálculo, o julgador deve prover a integração da norma,
elegendo outra base de cálculo. Para estes Magistrados, deve-se aplicar a regra
prevista no § 1º do artigo 193 da CLT, razão pela qual a parcela deve ser
calculada sobre o salário base do trabalhador.
Assim, ressalvado o entendimento pessoal deste Relator em
consonância com aquele exposto na SV nº 04, impõe-se acolher em parte o
recurso obreiro, por questão de disciplina judiciária, a fim de determinar que o
adicional de insalubridade seja calculado sobre seu salário base, restando-lhe,
pois, devidas diferenças e reflexos postulados, exceto nos DSR´s, nos termos da
Orientação Jurisprudencial nº da SDI-I do Colendo Tribunal Superior do
Trabalho.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, decide-se conhecer dos Recursos Ordinários e, na
forma da fundamentação, dar parcial provimento ao recurso do reclamado,
primeiro recorrente, para excluir a condenação ao pagamento de multa por
litigância de má-fé e para restringir a condenação ao pagamento dos minutos
efetivamente suprimidos do intervalo intrajornada, a serem apurados em regular
liquidação de sentença, conforme anotação nos controles de jornada carreados
aos autos, bem como prover em parte o apelo obreiro para deferir-lhe diferenças
de adicional de insalubridade e reflexos, mantendo-se no mais a r. decisão
recorrida, inclusive quanto ao valor fixado para a condenação.
MARCELO MAGALHÃES RUFINO JUIZ RELATOR
ACÓRDÃO Nº
PROCESSO TRT/15ª REG. Nº 00375-2004-008-15-85-3 - RECURSO
ORDINÁRIO.
RECORRENTE - SÃO FRANCISCO RESGATE LTDA.
RECORRIDO - FLÁVIO RONIS DOS SANTOS.
RECORRIDA - TRIÂNGULO DO SOL AUTO-ESTRADAS S/A.
ORIGEM - 1ª VARA DO TRABALHO DE SÃO CARLOS.
Trata-se de recurso ordinário em reclamação
trabalhista julgada procedente em parte, condenando a
Reclamada SÃO FRANCISCO RESGATE LTDA a anotar o contrato de
trabalho na CTPS do Reclamante e ao pagamento de aviso
prévio, saldo salarial, 13º salário, férias acrescidas de
1/3, FGTS com 40%, multa do artigo 477, §8o, da CLT,
adicional noturno, horas extras e reflexos, cesta básica e
seguro-desemprego, com responsabilidade subsidiária da
Reclamada TRIÂNGULO DO SOL AUTO-ESTRADAS S/A (fls. 416/424).
A Reclamada SÃO FRANCISCO RESGATE LTDA alega que deve ser
declarada a nulidade da sentença e determinada a citação da
denunciada para integrar o polo passivo da demanda, uma vez
que ela fora a única empregadora do Reclamante, que a
recorrente não agiu com intuito de fraude e que contratou o
Reclamante que era sócio da sociedade limitada denominada
PROCESSO TRT/15ª REG. Nº 00375-2004-008-15-85-3 - RECURSO ORDINÁRIO 2
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“M.A.”, motivo pelo qual deve ser afastada a declaração de
vínculo de emprego, afirma que não é devida a multa do art.
477, §8o da CLT, tendo em vista a ausência do vínculo de
emprego, por outro lado, afirma que não foi fixado o valor do
salário obreiro, dificultando a apuração da multa do artigo
477 da CLT, na mesma esteira, não são devidas as cestas
básicas, quanto às horas extras são indevidas em razão da
ausência de vínculo de emprego, a contratação da empresa “M.
A.” afasta o direito invocado, aduz que a jornada no sistema
12x36 é autorizada pela norma coletiva por ser mais benéfica
e há muito utilizada, pleiteia seja observada a época própria
para início da correção monetária, na forma da Súmula 381 do
C. TST, afirmando, por fim, que não há irregularidades que
justifiquem a expedição de ofícios, impondo-se o provimento
do recurso (fls. 437/451), com impugnação pelo Reclamante
(fls. 458/464).
É o relatório.
VOTO.
01. Tempestividade.
A intimação para a Reclamada (decisão de embargos
declaratórios) foi publicada na Imprensa Oficial no dia
18.01.08 (sexta-feira - fl. 436) e o recurso ordinário foi
interposto, tempestivamente, no dia 25.01.08 (fl. 437),
merecendo ser conhecido, uma vez observadas as demais
formalidades legais (depósito recursal e custas processuais:
fls. 453/454 e mandato: fls. 133, 409 e 451).
PROCESSO TRT/15ª REG. Nº 00375-2004-008-15-85-3 - RECURSO ORDINÁRIO 3
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02. Recurso Ordinário interposto pela Reclamada
São Francisco Resgate Ltda.
02.01. Nulidade da sentença. Denunciação da Lide.
Pretende a Reclamada a integração da empresa AERO
VIDA RESGATE AÉREO E TERRESTRE LTDA, no polo passivo da
demanda, aduzindo que no período de 20.08.1999 a 01.09.2001,
o Reclamante era empregado da referida empresa, a qual deverá
responder pelos direitos advindos da sentença.
Todavia, a reclamatória fora julgada improcedente
em relação ao período de 20.08.1999 até 01.09.2001 (fls.
419/420 e 423). Como a Reclamada não foi considerada
sucessora da empresa mencionada e não foi reconhecido o
vínculo empregatício até então (fl. 420), o indeferimento da
denunciação da lide somente lhe causa benefícios, de modo que
a alegação de nulidade, por cerceamento de defesa, deve ser
repelida.
02.02. Multa por embargos considerados
protelatórios.
Pretende a Reclamada seja excluída da condenação a
multa de 1% sobre o valor da causa, pela oposição de embargos
considerados protelatórios.
A r. decisão de embargos de declaração prestou
esclarecimentos a respeito da condição do Reclamante, como
não sócio da empresa “M. A.”, demonstrou que o valor das
cestas básicas foi deferido observada a CCT, que a jornada
reconhecida foi a do sistema 24x48h e não 12x36h e que o
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salário determinado na sentença levou em consideração a
inversão do ônus probatório e o depoimento do Reclamante
(fls. 432/433), motivo pelo qual os embargos não podem ser
considerados como meramente protelatórios.
Em que pese a entrega da prestação jurisdicional
completa, há que se respeitar o direito à ampla defesa e à
utilização dos recursos inerentes ao devido processo legal,
inclusive para apreciação de embargos declaratórios, para
exata compreensão da sentença e de seus limites, mesmo que
após o aclaramento, devam ser rejeitados.
Diante disso, o recurso ordinário merece
provimento, para que seja afastada da condenação a multa por
embargos de declaração considerados meramente
procrastinatórios.
02.03. Vínculo empregatício. Verbas.
Na petição inicial, o Reclamante alegou que, a
partir de 01.09.2001, passou a prestar serviços para a 1a
Reclamada (São Francisco Resgate Ltda) e que em maio de 2002
seu nome foi incluído como sócio da empresa de nome M.A.
Assistência à Saúde Ltda. (fl. 3). O Autor aduziu que assinou
o documento societário a pedido de Andréa Alves Soerensen
(também sócia da M.A. Assistência à Saúde - fl. 39), esposa
do proprietário da 1a Reclamada, Sr. Roberto Soerensen (fl.
144).
A Reclamada esclareceu na defesa (fls. 243 e
seguintes), que a segunda Reclamada terceirizou legalmente os
serviços de socorro às vítimas de acidentes rodoviários, mas
que o Autor não era seu empregado, já que integrava sociedade
contratada para consecução das atividades socorristas.
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A r. sentença de origem, por seu turno, declarou a
fraude na contratação da empresa “M. A. Assistência à Saúde
Ltda.”, uma vez que foi terceirizada a atividade fim da
primeira Reclamada e porque ficou demonstrada a subordinação
do trabalhador à empresa recorrente.
Analisando-se o contingente probatório,
inicialmente sob a ótica dos contratos firmados, nota-se que
a primeira Reclamada terceirizou o que se pode chamar de
atividade finalística. O objeto social da São Francisco
Resgates Ltda é, dentre outros, a “remoção de pacientes,
atendimentos e tratamentos domiciliares, atendimentos de
primeiros socorros” (fl. 145).
Já o contrato social da M. A. Assistência à Saúde
Ltda., indica, no item relativo ao seu objetivo, os “serviços
de enfermagem em remoção de pacientes, atendimento e
tratamento de emergências domiciliares e serviços de
enfermagem em atendimento de primeiros socorros” (fl. 54),
exatamente os mesmos serviços da primeira Reclamada.
E mais. O contrato firmado entre as duas empresas
objetivou “o fornecimento do pessoal especializado em
enfermagem e resgate, visando o atendimento de pessoas
acidentadas ou que necessitem de atendimento médico de
urgência, bem como de empresas que vierem contratar os
serviços objeto deste contrato de parceria” (fl. 260).
Além do mais, observou-se que, coincidentemente, a
esposa do proprietário da primeira Reclamada (Roberto
Soerensen), Andrea Alves Soerensen, também integra os quadros
da M. A. Assistência à Saúde (fl. 39). Conquanto não haja
ilegalidade no negócio jurídico, é prova indiciária de que os
contratos tinham a finalidade de burlar as normas
trabalhistas.
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Note-se, ainda, que do contrato firmado entre a
primeira Reclamada e a M. A. Assistência à Saúde não se
observou um só pagamento referente ao negócio.
Diferentemente, há lançamentos de depósitos bancários na
conta do Autor, revelando a onerosidade do contrato
entabulado entre ele e a 1a Reclamada.
Por outro lado, o Autor sempre se prestou serviços
para a primeira Reclamada (a partir de 01.09.2001), mesmo
antes da criação da empresa “M. A.” (maio de 2002) ou da
assinatura do contrato entre esta e a primeira Reclamada
(outubro de 2001 – fl. 263).
Mas não é só. As testemunhas ouvidas nos autos,
confirmaram que o Reclamante era subordinado à representante
da primeira Reclamada. A segunda testemunha do Reclamante
disse que “o reclamante trabalhava na base da 2a reclamada em
Ibaté” e que “o reclamante trabalhava para a 1a reclamada” e
que sabe desta informação “... porque via a supervisora lhe
dando ordens”. A testemunha reconheceu a supervisora do
Autor, afirmando que “a supervisora a qual o depoente se
refere é a Sra. Léa, preposta da 1a reclamada” e disse,
ainda, que “viu a sra. Léa fazendo reunião com todos os
enfermeiros na base de Ibaté”.
Já a testemunha da Reclamada não demonstrou
conhecimento dos fatos, uma vez que afirmou que “não
trabalhou como motorista junto com o reclamante” e que “o
depoente prestava serviços como motorista na base de Ribeirão
Preto” e sequer sabendo “quem era o proprietário da empresa
M. A.”.
A testemunha Israel asseverou que “o reclamante
era plantonista na enfermagem” (fl. 235), enquanto a
testemunha da Reclamada confirmou que “a frota de veículos
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era de propriedade da 1ª reclamada” (fl. 237), sendo que em
momento algum foi demonstrada a prestação de serviços pela
“MA”, mas apenas pelo próprio reclamante, o que comprova a
presença de pessoalidade.
A própria preposta admitiu que “era a depoente
quem organizava os plantações da primeira reclamada na
Autovias” (fl. 235) e que “era o Sr. Maurício quem dava as
ordens ao reclamante” (fl. 235), o que deixa evidenciada a
subordinação.
A onerosidade é incontroversa, havia continuidade
na prestação de serviços e estes não poderiam ser
considerados como meramente eventuais, na medida em que
inseridos na atividade-fim da 1ª reclamada.
Portanto, uma vez comprovada a prática de atos
destinados a evitar a incidência das normas celetistas e a
presença dos requisitos exigidos pelos artigos 2º e 3º, da
CLT, o vínculo empregatício deve ser mantido, como proclamado
na origem.
Uma vez mantido o vínculo empregatício entre as
partes, são também devidas as verbas dele decorrentes.
Assim, o recurso não merece acolhimento.
02.04. Multa do art. 477, §8o, da CLT
A maioria desta Quarta Câmara tem decidido que o
empregador que anota o contrato de trabalho na CTPS do
trabalhador não pode ser penalizado em maior extensão que
aquele que não cumpre nem mesmo esta elementar obrigação
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patronal. Diante disso, a negativa do vínculo empregatício,
mas com reconhecimento de prestação de serviços, é
insuficiente, por si só, para que seja mantida a condenação
em relação à multa prevista nos §§ 6º e 8º do artigo 477, da
CLT, que é devida, com ressalva do entendimento pessoal deste
Relator.
02.05. Cesta básica.
Diferentemente do que alega a Reclamada, as
convenções coletivas acostadas aos autos, cujas vigências
alcançam o contrato de trabalho reconhecido, conferem direito
às cestas básicas, assim como indicado nas cláusulas 46 e 47
de fls. 93 e 108, respectivamente.
Assim, reconhecido o vínculo de emprego e
demonstrada a existência de norma convencional assegurando o
direito à cesta básica, a r. sentença deve ser mantida por
seus próprios fundamentos, até porque a verba foi deferida
somente nos períodos em que juntadas as normas convencionais
aos autos (fl. 421).
02.06. Horas extras. Sistema 12x36. Falta de
previsão convencional.
A Reclamada recorre contra a condenação em horas
extras, aduzindo que a jornada desempenhada pelo Reclamante
era de 12 x 36 e estava autorizada pela norma coletiva
encartada aos autos.
A sentença reconheceu a prestação de serviços no
sistema de 24 X 48 horas de descanso (fls. 421), como alegada
na inicial (fl. 8) e confirmada pelas duas testemunhas do
Reclamante (fls. 235/236), sendo que a testemunha da
Reclamada nada informou sobre o horário de trabalho do
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Reclamante (fls. 236/237).
Quanto ao horário de trabalho, foi reconhecido o
cumprimento das 07h às 07h do dia seguinte, no sistema de 24
X 48 horas de descanso, sendo consideradas extraordinárias as
excedentes da jornada diária de oito horas (fl. 421).
Numa semana, o Reclamante cumpria apenas 16 horas
normais e na outra 24 horas normais, segundo a sentença,
porque ele trabalhava dois dias numa semana e três dias na
outra. A sentença merece, portanto, alguns reparos.
Na sentença anterior, da qual o Reclamante não
interpôs recurso, havia sido reconhecida a compensação de
horário de trabalho, com base nas normas coletivas juntadas
aos autos (fls. 180/181).
As normas coletivas juntadas com a inicial e cujo
cumprimento se pretendeu, estabeleceram a possibilidade de
compensação de horário de trabalho, até o limite de 48 horas
mensais, sem qualquer restrição (cláusula 6ª, parágrafo
primeiro; fl. 84; 101/102; e 115).
Assim, deverão ser consideradas extraordinárias
somente as horas excedentes da jornada semanal de quarenta e
quatro (44) horas.
02.07. Juros e correção monetária.
O Reclamante nem mesmo alegou o pagamento dos
salários no próprio mês trabalhado, nem formulou pedido de
incidência da correção monetária pelo índice do próprio mês
trabalhado (fls. 2/14), além do que os documentos juntados
aos autos revelam que o salário era creditado na conta
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corrente no mês seguinte ao de prestação de serviços (dias 7,
8, etc – fls. 26).
Em sendo assim, deve incidir a regra do parágrafo
único do artigo 459, da CLT, devendo ser observada a Súmula
nº 381 do C. TST, em relação à correção monetária das verbas
vencidas mensalmente.
Em relação às demais, deverá ser observada a
época própria prevista em lei (data do vencimento da
obrigação).
Quanto aos juros de mora, a sentença determinou
que eles fossem calculados a partir do ajuizamento (fl. 423),
obviamente no percentual previsto em lei (1%), de modo que
não se justifica o insurgimento.
02.08. Expedição de ofícios.
A r. sentença determinou a expedição de ofícios à
DRT, INSS e CEF (fl. 424). Uma vez reconhecida a não anotação
do contrato de trabalho na CTPS, deve ser expedido ofício à
DRT. Os demais ofícios são desnecessários, de acordo com a
recomendação contida no Provimento GP-CR nº 2/2007, deste
Tribunal Regional do Trabalho, até porque o INSS será
intimado da sentença, no momento próprio.
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Posto isto, decido conhecer, rejeitar a
preliminar de nulidade por cerceamento de defesa (nº 02.01) e
prover parcialmente o recurso ordinário interposto pela
Reclamada SÃO FRANCISCO RESGATE LTDA., na reclamação
trabalhista que lhe move FLÁVIO RONIS DOS SANTOS, para
afastar da condenação a multa por embargos de declaração
considerados meramente protelatórios (nº 02.02), para
considerar extraordinárias somente as horas excedentes da
jornada semanal de quarenta e quatro horas (nº 02.06), para
que a correção monetária seja feita pelo índice da data de
vencimento de cada parcela e, em relação às parcelas vencidas
mensalmente, pelo índice do mês seguinte ao de prestação de
serviços (nº 02.07) e para que a expedição de ofício fique
restrita à DRT (nº 02.08), nos termos da fundamentação, com
custas pelas Reclamadas sobre o valor de R$ 11.000,00 (onze
mil e quinhentos reais), no importe de R$ 220,00.
Paulo de Tarso Salomão
Relator
Lrf.
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